Templo de Ramakrishna em Calcutá
DIÁLOGO
8*
EM
DAKSHINESWAR COM VÁRIOS VISITANTES: 22 DE JULHO DE 1883
1
Estamos no dia 22 de julho de 1883, domingo. Os devotos chegam uns após
os outros para visitar o pamahamsa. A maioria tem um trabalho que não
lhes permite outro momento livre. Rakhal, Odhor1
e M juntos tomaram um carro em Calcutá e chegaram ao templo de Kali entre uma e
duas horas, durante a curta sesta do Mestre. Moni Mollik e alguns devotos já
estão sentados no quarto.
Atravessam
o vasto conjunto criado por Rani Rashmoni: os templos de Radha-Krishna e de Kali
a leste, a oeste a fileira dos pequenos templos de Shiva, e na extremidade o
quarto do Mestre com a varanda em semicírculo, de onde, estando de pé, ele
pode contemplar o Ganges. Entre o quarto e o cais encontra-se o jardim onde se
colhem flores para o culto; estende-se para longe em direção ao sul até o
muro, ao norte até o pequeno bosque do panchavati onde o Mestre,
outrora, havia praticado sua disciplina espiritual (sadhana)2,
e dali para o leste até as portas. As árvores cobertas de flores vermelhas e
brancas quase chegam a tocar o quarto. Entrando pela varanda, podemos ver ao
fundo as imagens santas do Mestre, entre as quais o Cristo estendendo a mão a
Pedro para salvá-lo das águas e uma estátua de Buddha. O Mestre está
ensinando, sentado sobre a pequena cama, de frente para o norte; os devotos estão
sentados sobre um colchão ou no chão mesmo, e não tiram os olhos da imagem
radiante do Mestre. Pela varanda, avistam-se as águas santas do Ganges;
aumentadas pela monção, elas se arrojam para o oceano, mal tendo tempo de
saudar de passagem o Senhor que reside aqui.
O
Sr. Moni Mollik é um brahmo já um pouco idoso, sessenta e cinco anos talvez.
Visitou Benares há algum tempo e está contando sua peregrinação.
MM
— E vi mais um sadhu. Ele diz que o essencial é o controle dos
sentidos e da mente, que não adianta nada repetir o dia inteiro “Senhor,
Senhor”.
SR
— Sei como é. Primeiro seguir uma disciplina: cultivar a equanimidade, o
controle dos sentidos, a capacidade de suportar o cansaço e o sofrimento. O
objetivo, nesse caso, é o nirvana. Esses praticantes são vedantistas. Passam o
tempo todo discriminando: “O Uno é real, o resto é ilusão”. É um caminho
muito difícil. Se o mundo é uma ilusão, você também é uma ilusão, o próprio
mestre é uma ilusão, suas palavras um sonho. Isso não está ao alcance de
todo mundo.
Como
fazê-lo entender isso? Pense na cânfora, que não deixa nenhum resquício ao
queimar. Se queimarmos madeira, restam cinzas. Ao fim da discriminação obtém-se
o êxtase (samadhi). Então não sobra mais nenhuma marca de “eu”,
“tu”, “mundo”.
Padmalochan3
era um grande vedantista. Naquela época eu repetia sem parar “Mãe, Mãe”,
e no entanto ele me estimava muito. Era o pandit oficial do rajá de
Burdwan. Veio para Calcutá e foi morar numa mansão perto de Kamarhati. Naquele
tempo eu queria conhecer pandits. Para saber se ele era vaidoso, mandei
Hridê até lá. Este me disse que sua sabedoria não lhe tinha subido à cabeça
e então fui ao seu encontro. Embora fosse um grande pandit e grande
vedantista, chorou ao me ouvir cantar as canções de Ramprasad! Nunca senti
tanto prazer em falar com alguém. Ele me dizia: “Renuncie ao seu desejo de
encontrar devotos4,
senão vai atrair multidões e isso o fará tropeçar”. Utsavananda, o guru de
Vaishnavcharan5,
discutia teologia com ele por correspondência. Foi por meio deles que fiquei
sabendo de uma história6
sobre Padmalochan. Uma vez, na corte, houve um debate teológico sobre o tema
“Qual é o maior: Shiva ou Brahma?” Ouviram a opinião de Padmalochan. Ele
respondeu com toda simplicidade: “Há quatorze gerações, nenhum de meus
ancestrais nunca viu nem Brahma nem Shiva”.
Ao
saber que eu havia renunciado completamente ao sexo e ao dinheiro, disse-me:
“Por que tanta renúncia? Distinguir uma moeda de um torrão7
já é ignorância”. Responder o quê? Eu lhe disse: “Meu caro, não sei de
nada disso. Só sei que o dinheiro e o resto não me interessam”.
Havia
uma vez um pandit muito arrogante. Rejeitava todas as formas divinas. Mas
quem é capaz de compreender os caminhos de Deus? Foi-lhe dado ver a Mãe sob a
forma da Energia Primordial (Shakti). Por um longo momento ele ficou sem
consciência externa e quando voltou a si nem sequer conseguia pronunciar “Kali”,
apenas repetia “Ka... Ka... Ka...”
UM
OUVINTE — O senhor conhece Biddashagor8.
O que acha dele?
SR
— Biddashagor possui sabedoria e caridade (daya), mas não a visão
interior. O ouro que traz em si está oculto. Se ele conseguisse descobrir esse
ouro, sua atividade diminuiria e finalmente cessaria. No fundo de seu coração
encontra-se o Senhor. Se ele tomasse consciência disso, sua mente se voltaria
para a contemplação. Alguns praticam por muito tempo a ação desinteressada
antes de chegar à renúncia. Então sua mente submerge em Deus.
Todas
as atividades de Biddashagor são excelentes. A compaixão é algo muito belo. A
compaixão (daya) e a cegueira (maya) são bem diferentes. A
compaixão é boa, a cegueira não. A cegueira nos faz amar nossos parentes:
esposa, filhos, irmãos, irmãs, sobrinhos e sobrinhas, pai e mãe. São os únicos
que amamos. A compaixão nos faz amar a todos os seres de modo imparcial.
2
M
— A caridade pode ser considerada como um entrave também?
SR
— Essa idéia não está ao alcance de todo mundo! A compaixão provém do
modo sattva9.
O modo sattva conserva, o modo rajas cria, o modo tamas
destrói. Mas o Absoluto está além dos três modos. Além da natureza.
Os
três modos não conseguem alcançá-Lo. Da mesma forma como um ladrão não
pode mostrar-se em público, com medo de ser preso. Os três modos são ladrões.
Ouçam uma história:
Um
homem estava caminhando por uma trilha na floresta, quando foi atacado por três
bandidos. Primeiro lhe tomaram tudo o que ele tinha. Depois um dos bandidos
disse: “Vamos nos livrar desse homem”, e ergueu o sabre para matá-lo. O
segundo disse: “Por quê? Basta amarrar-lhe os pés e as mãos e deixá-lo
aqui”. Então os bandidos amarraram-lhe os pés e as mãos e foram embora. Um
bom tempo depois, um deles voltou e disse: “E aí? Você está bem? Vim libertá-lo”.
Cortou as cordas que o atavam e disse-lhe: “Venha, vou levá-lo de volta à
estrada”. Caminharam juntos por muito tempo, depois o ladrão disse: “Aqui
está a estrada. Continue em linha reta e chegará à sua casa”. Então o
homem lhe disse: “O senhor me salvou a vida, venha até minha casa”. Mas o
ladrão disse: “Não, não posso entrar na cidade, a polícia me prenderia”.
Essa
floresta é o mundo. Ali encontramos três bandidos: sattva, rajas
e tamas. Eles despojam os seres do conhecimento da Realidade. Tamas
tenta matá-los e rajas procura ligá-los ao mundo. Mas sattva vem
libertá-los, dando-lhes refúgio contra a luxúria, a cólera e as outras paixões
nascidas de tamas, livrando-os também dos laços do mundo. Mas mesmo
assim não é mais que um ladrão e não é capaz de lhes dar o conhecimento da
Realidade; só pode indicar o caminho, dizendo-lhes: “Por ali você chegará
à sua casa”. Mas sattva não tem o direito de ir lá.
A
linguagem não consegue dizer o que é Brahman, o Absoluto. Aquele que O
conhece não consegue descrevê-Lo. Dizem que um barco quando entra nas “águas
negras10”
jamais retorna.
Quatro
amigos estavam passeando. Chegaram a um lugar cercado por um muro, um muro muito
alto. Ficaram curiosos por saber o que havia atrás. Ajudaram um deles a subir.
Ao chegar em cima, esse começou a rir “Ah! Ah! Ah!” e deixou-se cair para o
outro lado. Não explicou nada. Se aquele que vê só nos diz “Ah! Ah!” e
depois salta, então o que poderemos saber?
Jadabharata,
Dattatreya tiveram a visão de Brahman, mas não puderam descrevê-Lo.
Quando O atingimos no êxtase não há mais “eu”. Por isso Ramprasad disse:
“Se não11
o conseguires, ó minha mente, não leves Ramprasad”
A
mente não só deve ser dissolvida, mas também “Ramprasad”, isto é, o próprio
eu, deve desaparecer. E então haverá conhecimento do Absoluto.
UM
OUVINTE — Mas, senhor, Shukadeva12
não havia atingido o Conhecimento?
SR
— Alguns dizem que Shukadeva apenas viu e roçou com a mão o oceano de Brahman,
sem mergulhar. Foi por isso que conseguiu voltar e dar tantos ensinamentos.
Outros dizem que entrou no oceano mas voltou para o bem da humanidade. Deus não
lhe tirou completamente o “eu”, a fim de que ele pudesse recitar o Bhagavata
perante o rei Parikshit, e propagar o ensinamento espiritual. Deus lhe deixou o
“eu iluminado”.
UM
OUVINTE — E aquele que obteve o Conhecimento pode dirigir uma congregação
religiosa?
SR
— Discuti o conhecimento do Absoluto com Keshob Shen. Ele me disse: “Por
favor, fale-nos um pouco mais a esse respeito!” Eu lhe respondi: “Se eu o
fizer, você não poderá mais dirigir a sua igreja”. Ele retrucou: “Então
não falemos mais disso, senhor” (risos). Eu disse a Keshob: “eu”,
“meu”, tudo isso é ignorância. A ignorância faz dizer: “Sou eu que
estou agindo, veja minha esposa, meus filhos, meus bens, minha fama”. Keshob
me disse: “Mas senhor, se tirarmos o eu não sobra absolutamente mais nada!”
E eu lhe respondi: “Escute, Keshob, eu não disse para você renunciar a todo
o “eu”, somente ao “eu verde”, aquele que faz dizer: eu estou
agindo, minha esposa e meus filhos, eu sou um mestre
espiritual, etc. É o “eu verde”; se você renunciar a ele, restará o “eu
maduro”, aquele que faz dizer: “Sou Teu servo, sou Teu adorador, és Tu quem
age e não eu”.
UM
OUVINTE — Alguém cujo eu está “maduro” pode dirigir uma congregação?
SR
— Eu disse a Keshob: é o “eu verde” que proclama: “Sou um chefe, estou
fundando uma congregação, estou ensinando”. É muito difícil pregar. Para
isso é necessário uma ordem explícita de Deus, como no caso de Shukadeva, que
recebeu a ordem de anunciar o Bhagavata. Se alguém recebeu a
ordem de Deus em pessoa, então pode aconselhar ou ensinar sem perigo. Seu eu não
está mais “verde”, mas “maduro”. Eu disse ao Keshob: “Renuncie ao
“eu verde”. No “eu do servidor, do adorador”, não existe mais nada
ruim. Você busca reunir uma igreja, mas as pessoas que você reuniu não param
de provocar separações. Keshob respondeu: “Sim, senhor, ficam conosco três
anos, depois se vão para outro grupo e fazem enorme escândalo ao nos
deixar!” Eu lhe disse: “Por que você não presta atenção nas características
delas13?
Você aceita qualquer um como discípulo!”
E
eu disse mais ao Keshob: você deveria adorar a Energia Primordial (Shakti)14.
O Absoluto e Sua Energia são um só; é o mesmo Deus que é o Absoluto e também
Sua Energia. Enquanto conservamos a consciência do corpo, a dualidade perdura.
Para falar, é necessário que haja dualidade. E, de fato, Keshob aceitou Kali.
Um
dia Keshob veio aqui com seus discípulos. Eu lhe disse: “Gostaria de ouvir um
de seus sermões”. Então nos sentamos todos sob o pórtico frente ao Ganges e
Keshob falou. Depois disso descemos para o cais e discutimos muito. Eu disse:
“Aquele mesmo que sob um aspecto é o Senhor (Bhagavan), sob um outro
aspecto é o adorador (bhakta), e sob um terceiro a Escritura (Bhagavata15).
Então repitam Bhagavata-bhakta-Bhagavan”. Keshob repetiu, e todos os
discípulos fizeram o mesmo em seguida. Depois eu disse: “Agora repitam Guru-Krishna-Vaishnava16”.
Então Keshob disse: “Basta por hoje, senhor! Senão as pessoas vão nos tomar
por carolas!”
É
muito difícil ultrapassar os três modos17.
Para isso é necessário ter a experiência de Deus. Os seres vivos estão em
regime de escravidão no reino de maya, esta maya que lhes oculta
Deus. Ela mantém os homens na ignorância. Um dia Hridoy trouxe um bezerro, que
depois eu vi pastando, preso no jardim. Perguntei: “Hridê, por que você o
amarra assim todos os dias?” Hridoy disse: “Tio, espero mandá-lo para minha
casa no campo; quando ele crescer estará bom para o arado”. Quando ouvi isso,
perdi os sentidos. Veio-me à mente: “Que jogo de maya! Aqui estão
Kamarpukur e Sihor18,
e lá está Calcutá. Esse bezerro deverá fazer todo o enorme trajeto de uma
cidade à outra e depois, durante anos, vai puxar o arado. O mundo é isso! Maya
é isso!” Só muito tempo depois foi que voltei a mim.
3
Geralmente o Mestre ficava em êxtase. Acontecia-lhe a qualquer momento e
em qualquer lugar. E ele passava o restante do tempo em companhia dos devotos,
falando de Deus ou cantando o kirtan. Por volta das três ou quatro
horas, M o encontrou sentado na pequena cama, absorto. Um pouco mais tarde,
ouviu-o falar com a Mãe. Pôde ouvir isso: “Mãe, por que só deste uma
migalha para ele19?”
Ficou em silêncio por alguns instantes, depois disse: “Compreendi, Mãe, isso
lhe bastará para fazer Tua obra, para ensinar”. M perguntou-se se o Mestre
buscava comunicar seu poder espiritual a determinados discípulos, para
transformá-los em instrutores.
Só
M e Rakhal estavam no quarto. Ainda absorto, o Mestre disse a este: “Como você
estava bravo! Mas foi de propósito que eu o fiz ficar bravo, como um cirurgião
que deixa um abscesso crescer antes de abri-lo20!”
Após outro silêncio, disse: “Hazra21
é um pedaço de madeira seca, então por que vive aqui? Existe uma razão para
isso. Para que a peça seja divertida, é necessária a participação de Jatila
e Kutila22”.
Depois,
dirigiu-se a M: “É preciso aceitar as formas de Deus! Você compreende a
imagem da Mãe Protetora do mundo23?
Se Ela parasse de proteger o mundo, ele desabaria e seria aniquilado. Se alguém
consegue dominar o elefante da mente, a Deusa desperta em seu coração”.
RAKHAL
— “A mente é um elefante louco”.
SR
— O leão da Deusa subjuga esse elefante.
________________
Ao
entardecer, o ofício vespertino foi celebrado nos templos, mas o Mestre
permaneceu em seu quarto e recitou os Nomes do Senhor. Estava sentado sobre o
pequeno leito, com as mãos juntas. Haviam acendido o incenso e ele estava
absorto na presença da Mãe. O Senhor Gobindo Mukherji de Belgharia entrou com
alguns amigos. Prosternaram-se diante do Mestre e sentaram-se no chão com M e
Rakhal. Fora, a lua subia no céu e o universo parecia sorrir silenciosamente.
No quarto todos se calavam, contemplando a imagem tranqüila do Mestre em êxtase.
Um momento depois, ele começou a falar, num estado de semi-absorção.
SR
— Digam-me quais são suas dificuldades. Eu as explicarei.
Gobindo
e os outros refletiram.
GOBINDO
— Muito bem, por que a Mãe (Shyama: a azul) é representada assim24?
SR
— Por causa da distância. De perto Ela não tem cor. Como a água de um lago
que vista de longe parece negra, mas na palma da mão não tem cor. Quem se
aproxima de Deus percebe que Ele não tem nome nem forma. Ao afastar-se
novamente, revê-O como “minha Mãe de tez azul escuro”, da cor da flores na
relva. Será Ela masculina (Purusha) ou feminina (Prakriti, a
Natureza)? Um devoto estava celebrando o culto; um outro aproximou-se e viu que
a imagem da Mãe estava com o cordão sagrado25.
Disse então: “O que você fez? Vai deixar esse cordão sagrado no pescoço da
Mãe?” O outro respondeu: “Talvez você A conheça melhor do que eu, irmão!
Ainda não consegui saber se Ela é Purusha ou Prakriti”. Aquele
que é Shyama é também Brahman. Aquele que tem forma é sem
forma também. Aquele que tem atributos é também sem atributos. Brahman-Shakti,
Shakti-Brahman: não há distinção.
GOBINDO
— Por que Ela é chamada Yogamaya26?
SR
— Essa palavra significa a união de Purusha e Prakriti. Tudo o
que você vê ao seu redor resulta dessa união. Na imagem de Shiva-Kali27,
Kali está de pé sobre o corpo de Shiva. Shiva está estendido como um cadáver;
Kali O está olhando. Tudo isso simboliza a união de Purusha e Prakriti.
Purusha, o princípio masculino, é inativo, por isso Shiva está inerte
como um cadáver. Em união com esse Purusha, Prakriti, o princípio
feminino, realiza todas as ações. Ela opera a criação, a conservação e a
destruição.
A
imagem de Radha-Krishna tem o mesmo significado. Krishna inclina-se para Radha a
fim de expressar essa unidade. O nariz de Sri Krishna traz uma pérola e o de
Radha uma pedra azul. A tez dourada de Radha é brilhante como a pérola e a tez
de Krishna é azul escuro como a pedra. Por outro lado, Krishna usa uma roupa
amarela e Radha uma roupa azul.
Qual
é o adorador perfeito? Aquele que, depois de ter conhecido Brahman, vê que
Este se tornou os seres vivos, o mundo, os vinte e quatro princípios cósmicos28.
Primeiro o discernimento (“isso não, isso não”) permite-lhe atingir o
teto. Depois ele vê que o resto da construção é feito dos mesmos materiais
que o teto: tijolos, cal, argamassa. A escada também é feita de tudo isso.
Desse modo, Brahman tomou a forma de todas as coisas: o mundo e os seres
individuais.
Mas
a discriminação por si só? Que interesse pode ter? Argh! — o Mestre cuspiu
— para que passar minha vida discriminando secamente? É melhor que haja “Tu
e eu”, para que exista a pura devoção a seus pés de lótus.
(Dirigindo-se
a Gobindo) — Às vezes eu Lhe digo “Tu és eu e eu sou Tu”, mas outras
vezes digo “só Tu, Tu és Tu” e não consigo nem sequer encontrar “eu”
algum.
A
descida de Deus (avatar) é também uma manifestação de Sua Energia (Shakti).
Alguns dizem que Rama e Krishna são apenas duas vagas do oceano do Ser e da
Bem-Aventurança (Satchidananda).
Após
o conhecimento da não-dualidade (advaita) vem a consciência (chaitanya).
Então percebemos que em todos os seres Ele é a consciência. Depois dessa
consciência vem a bem-aventurança (ananda). Advaita, Chaitanya,
Nityananda30!
(Dirigindo-se
a M) — Repito-lhe: não rejeite as formas divinas! Acredite que Ele pode tomar
forma! Depois você poderá meditar sobre a forma que preferir31.
(A
Gobindo) — Guarde bem isso: enquanto o homem sente desejo de saborear o mundo,
não pode sentir verdadeira nostalgia da visão e do conhecimento de Deus.
Quando uma criança está brincando, esquece todo o mais. Mesmo se lhe
oferecermos uma guloseima, ela comerá apenas um pedacinho, distraidamente. Mas
quando se cansa de brincar, de comer doces, declara: “Agora volto para minha
mamãe”. Então, seja quem for que lhe proponha levá-la de volta para casa,
que a beije e reconforte, ela o seguirá, mesmo sem nunca tê-lo visto. Quando
um homem perde o desejo de saborear o mundo, seu desejo de Deus desperta. Só
lhe fica um único pensamento: como fazer para encontrá-Lo? E então ele ouve
qualquer pessoa que lhe fale de Deus.
M
pensou: “É verdade, o desejo de Deus só desperta quando o desejo do mundo se
vai”.
_______________
DIÁLOGO
9*
EM
DAKSHINESWAR COM OS DISCÍPULOS: 19 DE AGOSTO DE 1883
1
Estamos num domingo, por volta de meio-dia. Foi tocado oboé (shanai)
durante a oferenda de alimento nos templos, depois os recintos dos deuses foram
fechados para o repouso da tarde. O Mestre recebeu sua parte de prasad,
fez uma rápida sesta, depois sentou-se no pequeno leito. Nesse momento M
chegou; prosternou-se diante dele ao entrar e juntos falaram de Vedanta.
SR
— Ouça, o Ashtavakra Samhita trata do conhecimento do Eu. Aqueles que
buscam o conhecimento do Eu dizem “Eu sou Aquilo”, isto é, “Eu sou a Alma
Suprema”. É a atitude dos renunciantes vedantistas, mas ela não convém aos
que vivem no mundo. Será que alguém consegue ocupar-se de todos os seus
afazeres afirmando ao mesmo tempo “Eu sou o Absoluto inativo”? Os
vedantistas dizem que a Alma Suprema (Atman) é imaculada. O prazer e a
dor, as ações justas e injustas, fazem sofrer aqueles que se identificam com o
corpo, mas não afetam a Alma Suprema. A fumaça suja as paredes, mas não é
capaz de sujar o espaço.
Krishnokishor
dizia: “Eu sou o Espaço1”.
Era um grande devoto e tinha o direito de dizer essa frase, mas ela não convém
a qualquer boca.
Porém,
dizer “Eu sou livre” é uma boa atitude. Ao pensar que é livre, a pessoa se
liberta pouco a pouco. Ao pensar “Eu estou ligada”, também vai aos poucos
tornando-se ligada. Um indivíduo que repete sem parar “Eu sou um pecador, um
pecador”, é certo que vai acabar caindo! Precisamos dizer: “Pronunciei Seu
Nome, onde foram parar meu pecado e minhas ligaduras?”
Escute,
estou com a mente atormentada hoje. Hridê2
me escreveu. Está muito doente. Será compaixão (daya) ou cegueira (maya)
de minha parte?
Como
responder? M ficou em silêncio.
SR
— Você sabe o que é a cegueira: preferir a tudo o pai, a mãe, irmãos e irmãs,
esposa e filhos, sobrinhos e sobrinhas. E a compaixão é amar a todos os seres.
Então, será compaixão ou ilusão em mim? Hridê fez tanto por mim, todos os
serviços possíveis, chegou até a me limpar com suas próprias mãos3.
Mas no final tudo se tornou um suplício. Ele me atormentava tanto que uma vez
desci ao cais para me jogar no Ganges e deixar esse corpo. É verdade que ele
fez muito por mim. Se eu pudesse enviar-lhe um pouco de dinheiro, minha mente se
acalmaria. Mas ao qual dos nossos babus devo recorrer? E o que as pessoas
iriam dizer?
2
Entre duas e três horas chegaram dois grandes devotos: os Srs. Odhor
Shen4
e Boloram Boshu. Prosternaram-se diante do Mestre e sentaram-se. Perguntaram-lhe
como ia indo. O Mestre respondeu: “Estou bem, o corpo vai bem, mas a mente está
um pouco perturbada”. Não disse nada sobre a doença de Hridoy.
O
assunto da conversa foi a estátua da Mãe sentada sobre um leão (simhavahini),
na casa de Mollik em Borobazar.
SR
— Fui ver a Deusa, na casa de Mollik de Chashadhopa. A família está em decadência,
eles são pobres. Havia excrementos de pombos aqui e ali, musgo e montinhos de
areia e estuque caídos das paredes. Em relação aos outros parentes dos Mollik
que conheço, esses não tiveram sorte. (Dirigindo-se a M) — Muito bem,
diga-me como você explica isso. Está vendo? O que acontece com as pessoas é
fruto de suas ações passadas; é preciso acreditar nisso e no karma
residual, etc. No entanto, naquela casa arruinada, vi o rosto resplandecente de
luz da Deusa. Também é preciso acreditar numa manifestação como essa.
Uma
vez fui a Vishnupur. O rajá local possui vários belos templos. Lá existe uma
imagem da Deusa chamada Mrinmoyi. Perto desse templo há grandes reservatórios
de água. Muito bem, diante de um deles senti o perfume que as mulheres usam no
cabelo. Você pode me explicar isso? Ninguém me havia dito que as moças que vão
ver a Deusa Lhe oferecem esse perfume. E perto do reservatório, antes mesmo de
penetrar no templo, entrei em êxtase e tive a visão de Mrinmoyi, saindo da água.
O
quarto havia-se enchido. Falou-se das notícias de Kabul: o levante e a guerra.
Alguém anunciou que Yakub Khan fora destronado. Depois, dirigindo-se ao Mestre,
disse: “E no entanto, senhor, Yakub Khan era um grande devoto!”
SR
— Como você está vendo, tudo o que encarna fica submetido ao prazer e à
dor. No Chandi de Kobi Konkon se diz que Kalubir foi lançado à prisão,
com uma pedra enorme sobre o peito. No entanto, ele era o bem-amado da Mãe.
Enquanto tivermos corpo, sentiremos prazer e dor. Shrimonto era um grande
adorador e a Deusa amava muito sua mãe Khullona, mas como ele teve que sofrer!
Levaram-no ao cadafalso para decapitá-lo. Certo lenhador era um devoto
ardoroso, teve a visão da Mãe e alcançou dEla inúmeras graças, mas teve que
continuar sua vida dura de lenhador. Em sua prisão, Devaki teve a grande visão
do Senhor5,
com seus quatro braços segurando a concha, o disco, a clava e o lótus, mas
isso não lhe abriu as portas da prisão.
M
— Mas não era o caso de Devaki deixar a prisão e sim seu corpo, a causa de
toda aquela miséria!
SR
— Está vendo? Tudo aquilo era o efeito do karma residual6.
Enquanto não dá o seu fruto, o corpo é mantido. Um homem caolho foi banhar-se
no Ganges: todos os seus pecados foram apagados, mas ele não recuperou seu olho7
(risos). Era o fruto do karma de seus nascimentos anteriores.
M
— Quando a flecha deixa o arco, não se pode mais detê-la.
SR
— Um devoto conserva o conhecimento e o amor mesmo quando seu corpo sente
prazer e dor. Aquele resplendor nunca tem fim. Veja como os Pandavas8
sofreram! Mesmo assim, nunca perderam a presença de Deus. E quem pode
comparar-se a eles em termos de conhecimento e devoção?
3
Naquele
momento, Norendro e Bisshonath Upadhey entraram. Bisshonath era intendente do
Marajá do Nepal e o Mestre chamava-o de Capitão9.
Norendro tinha vinte e dois anos e estava preparando o B.A.10.
De vez em quando vinha ver o Mestre, em geral aos domingos. Prosternaram-se e
sentaram-se. O Mestre pediu a Norendro para cantar. Uma tampura estava
pendurada na parede oeste. Todos olhavam para Norendro. À esquerda havia também
uma tabla e ele começou a afiná-la. Então ia cantar!
SR
(dirigindo-se a Norendro) — Parece que não está soando bem!
CAPITÃO
— É que ele está muito cheio, então fica calado (risos) — cheio até a
tampa11!
SR
— Mas, e Narada12
e os outros?
CAPITÃO
— Foi por compaixão que eles falaram.
SR
— Muito bem! Narada, Shukadeva e os outros desceram de volta após o samadhi,
por compaixão, para o bem dos demais. Foi por isso que falaram.
Norendro
começou a cantar “Quando chegar o dia”:
Um dia, no
oceano de beleza mergulharei
E
contemplarei Tua forma infinita, meu Senhor.
Estupefato,
trêmulo, refugiar-me-ei a Teus pés,
Aos pés
do Rei dos reis, paz e bondade sem mistura.
ConTigo
trocarei minha alma pelo belo fruto da vida,
O paraíso
nesta terra mesmo. Quem mais me ofereceria isto?
Do meio do
mal, olho para Ti, Senhor.
Assim como
corremos ao avistar uma luz na noite,
Tua visão
me arrancará das trevas do pecado.
Assim como
se ergue no firmamento a lua crescente,
Fazendo as
chakoras*
dançar de alegria, do mesmo modo minha alma
Espera ver
subir no firmamento do coração
Tua forma
bendita de alegria e imortalidade.
Eterna
estrela polar, esperança ardente da fé,
Amigo dos
humildes, satisfaz a esperança de minha alma!
Assim, dia
e noite mergulharei em Teu Amor,
Esquecendo-me
a mim mesmo, ficarei a Teus pés.
Ao
ouvir as palavras “Tua forma bendita de alegria e imortalidade”, o Mestre
foi levado a um profundo êxtase. Estava sentado de frente para o leste, com as
mãos juntas, o corpo ereto, mergulhado no oceano de beleza da Mãe. Nenhuma
consciência do mundo exterior. Sem respiração aparente, nenhum movimento, nem
sequer um batimento das pálpebras. Parecia uma imagem pintada, como se houvesse
deixado este mundo, partindo para outro lugar.
4
O
êxtase dissipou-se lentamente. Enquanto isso, Norendro fora para a varanda a
leste do quarto, onde o Sr. Hazra13
estava sentado sobre um tapete com seu rosário na mão. Puseram-se a conversar.
O quarto do Mestre estava cheio de gente. Ao sair do êxtase, o Mestre percorreu
com o olhar o grupo dos devotos. Não via Norendro, a tampura jazia
abandonada e os olhares de todos os devotos fixavam-no inquietos.
SR
— Ele veio, acendeu a fogueira e foi embora! (Dirigindo-se ao Capitão e aos
outros) — Vocês também, tomem consciência de Deus e encontrarão alegria. A
alegria de Deus está realmente bem próxima, mas oculta por um véu. Quanto
mais diminui o apego ao mundo, mais aumenta a inclinação para Deus.
CAP.-
Quando voltamos para casa em Calcutá, afastamo-nos de Benares, e quando vamos
para Benares afastamo-nos de Calcutá14.
SR
— Quando Radha ia-se aproximando de Krishna, sentia cada vez mais Seu perfume.
Quando se caminha para Deus, sente-se um amor cada vez mais forte. Quanto mais
se desce o rio em direção ao oceano, mais se percebe o fluxo e o refluxo da
maré. Na alma do jñani a água corre numa única direção. Na sua
opinião, o mundo inteiro é um sonho. Ele permanece sempre em sua Natureza
Essencial. Mas na alma do bhakta há várias correntes, o fluxo e o
refluxo. Ele ri e chora, canta e dança. O bhakta gosta de brincar com
Deus. Ora nadando, ora mergulhando, ora subindo à tona, como os pedaços de
gelo que dançam na água, “tapur-tupur, tapur-tupur” (risos).
________________
Os
vedantistas desejam conhecer o Uno e o devotos conhecer o Senhor — o Senhor
Todo-Poderoso, com Suas múltiplas glórias. Mas na realidade não há diferença
entre Eles, entre o Uno e Sua Energia, entre Brahman e Shakti.
Como uma jóia e seu brilho. O brilho da jóia imediatamente faz pensar na jóia,
a jóia faz pensar no brilho, impossível pensar em um sem o outro. Um só Deus
(Satchidananda) manifesta-Se mais ou menos, sob diversos disfarces, donde
Suas formas múltiplas. Mas, “Ó Mãe, Tu mesma és tudo isso!” Quando O
consideramos agindo — criando, conservando, destruindo — nós O chamamos
Shakti. Mas se a água calma é água, as ondas e a espuma são água também. O
mesmo Absoluto, Ser, Conhecimento e Bem-Aventurança (Satchidananda) é
também a Energia primordial, Aquela que cria, preserva e destrói. Como o Capitão
tranqüilamente em sua casa, o Capitão celebrando o culto doméstico, ou o
Capitão em visita ao vice-rei. Ele só muda de roupa!
CAPITÃO
— É verdade mesmo, Senhor.
SR
— Eu disse a mesma coisa a Keshob Shen.
CAPITÃO
— Keshob Shen perdeu sua casta e mudou nossas tradições de acordo com seus
caprichos. Não é um sadhu e sim um babu.
SR
(aos ouvintes) — O Capitão está me proibindo de ir à casa de Keshob Shen!
CAPITÃO
— Mas é claro que não, Senhor! Vá à casa dele! O que estou dizendo não
tem nenhuma importância!
SR
(irritado) — Você tem o direito de ir à casa do vice-rei15
por amor ao dinheiro, mas eu não tenho o direito de ir à casa de Keshob Shen,
que pensa em Deus sem parar e repete o Seu Nome! Você mesmo não diz que o
mundo é a maya de Deus? Deus está presente em cada ser e no mundo
inteiro.
5
De repente, o Mestre levantou-se e saiu para a varanda a leste. M
seguiu-o, mas o Capitão e os outros permaneceram sentados, esperando seu
retorno. Na varanda, Norendro e Hazra estavam conversando. Hazra era um
vedantista ressequido: afirmava que o mundo é um sonho, o culto uma superstição
e que só se deve buscar o Ser, tendo como meta descobrir que “eu sou
Aquilo”.
SR
(sorrindo) — E aí? Do que vocês dois estavam falando?
NOREN
(sorrindo) — Ai, ai, ai! Montões de coisas! E profundas!
SR
(sorrindo) — Mas o Conhecimento e o Amor são idênticos, não é? Onde a
consciência pura leva, o amor puro leva também. E o caminho é mais fácil.
NOREN
— “Mãe, enlouquece-me com Teu Amor, de que me serve o conhecimento?”
(Voltando-se para M) — Olhe, encontrei em Hamilton que “A learned
ignorance is the end of philosophy and the beginning of religion”.
SR
(a M) — O que foi que ele disse?
NOREN
— Quando uma pessoa estudou a filosofia a fundo, manda às favas a ilusão do
saber e só se interessa pela religião. A religião pode começar.
SR
— Thank you! Thank you! (todos riem).
________________
6
Um momento depois, com a chegada da noite, a maioria dos presentes
despediu-se e foi embora. Norendro também partiu.
O
dia terminava. Por todos os lados viam-se empregados do templo preparando as
luzes para o culto vespertino. Os dois sacerdotes de Kali e Vishnu foram
banhar-se no Ganges para purificar-se externa e internamente. Depois chegou o
momento do serviço religioso e do repouso das divindades. O frescor da noite se
fez sentir. As pessoas da aldeia vieram passear no jardim, com a bengala na mão,
em grupos de amigos, respirando o ar puro e o perfume das flores. Desceram para
o cais, sobre o rio transbordando das chuvas, rápido como uma torrente e
agitado pelas ondas. Alguns, mais meditativos talvez, passeavam na solidão do panchavati.
O Mestre, na varanda oeste, também contemplou o Ganges por um momento.
As
lamparinas foram acesas. A criada veio queimar incenso no quarto do Mestre. O
serviço vespertino começou nos doze templos de Shiva de um lado e nos templos
de Vishnu e Kali do outro. Os sons suaves ou graves das conchas, sinos e sinetas
fizeram-se ouvir, mesclados ao murmúrio incessante do Ganges ao longo de suas
margens. Era o segundo dia do plenilúnio e a lua subiu no céu, inundando com
sua luz o grande pátio, as copas das árvores do jardim e, mais ao longe, a
corrente do vasto rio.
Após
o serviço, Sri Ramakrishna saudou a Mãe do universo e começou a ladainha dos
Nomes de Deus, batendo palmas. À sua frente, as imagens do Senhor: Dhruva e
Prahlada, a imagem de Rama coroado, Kali a Mãe, Radha com Krishna. Ele se
voltou para cada uma delas, nomeou-a e saudou-a. Depois recitou Brahman-Atman-Bhagavan,
Bhagavata-bhakta-Bhagavan, Brahman-Shakti, Shakti-Brahman,
Veda-Purana-Tantra, Guita-Gayatri. Depois “Sê meu refúgio, sê
meu refúgio. Não eu, mas Tu; não eu, mas Tu. Eu sou o carro e Tu o
condutor”, etc. Enfim, juntou as mãos e ficou imóvel, meditando na Mãe.
Um
pequeno número de devotos voltou para sentar-se no quarto, depois de ter
assistido ao culto ou passeado. Agora o Mestre estava sentado no pequeno leito.
M, Odhor, Kishori e alguns outros estavam sentados no chão à sua frente.
SR
— Norendro, Bhobonath e Rakhal são da classe dos sempre-livres, sempre próximos
do Senhor. Não precisam de ensinamento. Vejam como Norendro é independente.
Outro dia, subiu comigo no carro do Capitão. O Capitão lhe disse para
sentar-se num lugar melhor, mas Norendro mal lhe respondeu. Mesmo a mim ele
trata sem muita consideração. Quando sabe alguma coisa, esconde-o de mim, para
que eu não saia dizendo a todo mundo como ele é inteligente. Ele não está
ofuscado por maya, não é apegado. Tem uma natureza excelente e muitas
qualidades: sabe cantar, tocar instrumentos, é muito instruído. Com tudo isso,
é dono de si mesmo e diz que nunca se casará. Norendro e Bhobonath se entendem
muito bem. Norendro é muito viril e Bhobonath tem uma natureza mais feminina.
Norendro não vem com muita freqüência. É melhor assim, pois sua presença me
perturba profundamente.
_______________
DIÁLOGO
10*
FESTA
NA CASA DE MANI MALLIK: 26 DE NOVEMBRO DE 1883
1
A festa anual do Brahmosamaj1
de Shindurepoti foi organizada desta vez na casa do Sr. Monilal Mollik2,
situada na Chitpore Road, ao norte do cruzamento da Harrison Road, no bairro dos
vendedores de frutas. Para a reunião, o Sr. Mollik escolheu uma grande sala com
varanda, alegremente decorada por dentro e por fora com folhagens, flores e
guirlandas. Numerosos brahmos já se encontram em seus lugares, aguardando o início
da cerimônia. Mas nem todos estão na sala de oração: alguns caminham de um
lado para outro no terraço, outros permanecem sentados em bancos lá fora. O
anfitrião ou seus parentes aparecem de vez em quando para receber convidados ou
acertar algum detalhe. Numerosos brahmos chegam um pouco antes do ofício
vespertino, estimulados por uma atração suplementar no dia de hoje: foi-lhes
prometida a visita do pamahamsa, que admiram por muitas razões. Seus
chefes Keshob, Bijoy e Shibnath têm Sri Ramakrishna em grande estima. Ouviram
dizer que ele está embriagado por Deus, queimando de amor e fé, que conversa
com Deus como uma criança e chora por Ele lágrimas de amor e saudade; que em
todas as mulheres ele adora a presença da Mãe e repele qualquer conversa sobre
assuntos mundanos, mas fala só de Deus sem parar3.
Sabem também que ele aceita todas as atitudes religiosas, sem nunca criticar
nem condenar, e deseja ardentemente encontrar todos os tipos de devotos. Tudo
isso fez vir os brahmos hoje, alguns dos quais de muito longe.
Antes
do ofício, o pamahamsa conversa alegremente com Bijoy e outros brahmos.
A cerimônia não vai demorar; na sala de orações as lamparinas já estão
acesas. O Mestre pergunta: “Então, Shibnath não vai vir?” Um brahmo
responde: “Não, ele está com muito trabalho, não vai poder vir hoje4”.
SR
— Eu ficaria feliz em vê-lo! Ele parece estar sempre mergulhado na felicidade
de bhakti. Além disso, quando um homem se torna famoso como ele é
porque traz em si uma parcela da força de Deus. Mas Shibnath tem um grande
defeito: ele falta com a palavra. Havia prometido me visitar lá (no templo de
Kali), mas não veio e não falou mais no assunto. Isso não se faz. Dizer a
verdade é a desciplina espiritual que mais convém à nossa Era de Ferro (kaliyuga).
Aquele que se limita estritamente à verdade acaba vendo Deus e aquele que se
afasta dela caminha lentamente para sua perda. Suponhamos que eu tenha dito que
vou fazer minhas necessidades; muito bem, mesmo que não precise mais ir, eu
pego meu pote com água e vou até os tamarindos. Preciso ater-me estritamente
à verdade, senão não tenho descanso.
Depois
que tive a visão da Mãe5,
peguei flores e as ofereci para Ela dizendo6:
“Mãe, eis aqui o conhecimento e a ignorância, toma-os de volta e dá-me o
Amor puro! Mãe, eis aqui a virtude e o vício, toma-os de volta e dá-me o Amor
puro! Mãe, eis aqui a pureza e a impureza, toma-os de volta e dá-me o Amor
puro! Mãe, eis aqui o bem e o mal, toma-os de volta e dá-me o amor puro!”
Pude dizer tudo isso, mas não “Mãe, eis aqui a verdade e a mentira”; isso
eu não pude. Entreguei tudo à Mãe, exceto a verdade.
O
serviço começou segundo os costumes do Brahmosamaj: o oficiante subiu ao
altar, sob o candelabro, e abriu a cerimônia invocando Brahman Supremo. Os
grandes mantras védicos foram repetidos pela assistência, as santas invocações
saídas da boca dos antigos sábios da Índia: “Brahman é verdade e
conhecimento; é bem-aventurança e imortalidade; é bênção, paz e unidade;
é pureza e perfeição”. Esses mantras mesclados ao som da sílaba sagrada OM
encontravam eco no coração dos brahmos, extinguiam neles os desejos
mundanos, acalmavam sua mente e a preparavam para a meditação. Todos fecharam
os olhos e oraram interiormente ao Brahman com atributos7.
O
pamahamsa estava mergulhado no êxtase, sem movimento, com o olhar fixo,
mudo e rígido como uma estátua. O pássaro da alma estava ausente, fora para
algum reino de bem-aventurança ignorado por nós e só o corpo permanecia ali
como uma casa vazia.
O
êxtase cessou bruscamente. O Mestre abriu os olhos, olhou para todos os lados,
viu que as pessoas ainda estavam com os olhos fechados e pôs-se de pé dizendo
Brahman! Brahman! Trouxeram tambores e címbalos e o kirtan começou.
Embriagado de Amor, o Mestre juntou-se à dança dos brahmos. Sua maneira de dançar,
muito doce, cativava os olhares, e Bijoy e os outros brahmos giravam em círculos
ao seu redor. Contemplando aquela dança maravilhosa, muitos comungaram com a
alegria do kirtan e esqueceram por um momento o mundo, suas preocupações
e alegrias, amargas em comparação com o vinho do Amor.
Ao
final do kirtan, todos se sentaram em círculo ao redor do Mestre, ávidos
por ouvir o que ele ia lhes dizer.
2
Dirigindo-se aos brahmos reunidos, o Mestre disse:
-
É muito difícil viver no mundo sem se sujar. Protap8
me dizia: “Senhor, o rei Janaka é nosso modelo9;
já que ele viveu no mundo sem se sujar, nós também podemos fazê-lo”. Eu
lhe respondi: “Você pensa que é fácil viver como o rei Janaka? Quantas
austeridades ele teve que praticar para obter o conhecimento! Anos de
austeridades terríveis, com a cabeça para baixo e os pés para cima10,
antes de voltar ao mundo”.
Então
não há nenhuma saída para os que vivem no mundo? Claro que sim! De vez em
quando é preciso retirar-se em solidão para praticar disciplinas espirituais.
É na solidão que se pode obter o Amor e o Conhecimento. Depois não há mais
perigo em voltar para o mundo. Mas é preciso ir praticar em completo
isolamento: longe da esposa, filho ou filha, pais, amigos — ninguém! E
durante esse tempo de retiro, pensar consigo mesmo: “Não tenho ninguém além
de Deus, Ele é tudo para mim” e suplicar-Lhe e chorar para que Ele conceda o
Amor e o Conhecimento.
Se
vocês me perguntarem quanto tempo é necessário passar assim longe do mundo,
eu lhes direi que um dia já está bom, três dias melhor ainda, doze dias, um mês,
um ano, de acordo com as possibilidades de cada um. Uma vez obtidos o Amor e o
Conhecimento, não há nada a temer do mundo.
Esfregando
óleo nas mãos, podemos abrir o fruto da jaqueira11
sem colar os dedos. Ao brincar de policial e ladrão, aquele que toca a “avó12”
não pode ser preso. Aquilo que foi transmutado em ouro pelo toque da pedra
filosofal continua sendo ouro para sempre: mesmo que fique enterrado por mil
anos num buraco, continuará sendo ouro.
A
mente é como o leite. Se despejarmos nela a água do mundo, eles se misturam.
Mas podemos tirar o creme e fazer manteiga. Retirar-se em solidão é como bater
o creme para tirar a manteiga do Amor e do Conhecimento. Depois a manteiga não
se mistura mais com a água: flutua por sobre ela sem se molhar.
3
O Sr. Bijoy Gosshami acabava de voltar de Gaya13.
Lá ele ficara por muito tempo em solidão ou na companhia dos sadhus e
até havia adotado o hábito ocre dos monges errantes. Sua mente estava muito
elevada, constantemente voltada para o interior14.
Estava sentado perto do Mestre, cabisbaixo, como que mergulhado em seus
pensamentos.
O
Mestre olhou para ele um momento, depois lhe perguntou: “Então, Bijoy, você
encontrou um quarto?” Depois explicou: “Um dia, dois monges errantes
encontraram-se numa cidade. O primeiro estava passeando com as mãos vazias e a
boca aberta, olhando o mercado, as lojas e as casas. O segundo lhe disse: ‘Você
está olhando maravilhado para tudo isso. Onde colocou seus pertences?’ O
outro lhe respondeu: ‘Quando cheguei, aluguei um quarto, tranquei minhas
coisas com chave e saí despreocupado para passear’. Por isso é que estou
perguntando se você também encontrou um quarto”. E voltando-se para M e os
outros: “Estão vendo? A fonte que Bijoy tinha em si estava oculta, mas agora
está fluindo”.
(Dirigindo-se
a Bijoy) — Veja todos os aborrecimentos de Shibnath! Ele tem tanto trabalho!
Todos aqueles artigos para os jornais! Os afazeres do mundo lhe tiram a paz, sua
cabeça está cheia de preocupações.
O
Bhagavata conta a história do Avadhuta15,
o renunciante que teve vinte e quatro gurus. Um deles era um milhafre16.
Uma vez, alguns pescadores haviam apanhado peixes; um milhafre desceu como uma
flecha e roubou um peixe. De todos os lados vieram corvos grasnando, “cra...,
cra...”. Para onde voava o milhafre os corvos o perseguiam: para o sul, eles
iam atrás, para o norte, eles acompanhavam, para o leste ou oeste, eles o
seguiam. De tanto girar e girar o peixe caiu e imediatamente os corvos deixaram
o milhafre para brigar entre si. O milhafre pousou tranqüilamente num galho e
pensou: “Quanto barulho por um peixe! Agora que ele caiu posso ficar em
paz”.
O
Avadhuta aprendeu isso do milhafre: aquele que guarda um peixe, isto é, aquele
que possui alguma coisa, é obrigado a lutar e perde a paz, ao passo que
renunciando a desejar e possuir encontra a tranqüilidade.
É
verdade que a ação sem apego é boa e não perturba a paz. Mas ela é muito
difícil de se alcançar. Eu imagino que estou agindo de modo desinteressado e,
de repente, sem aviso prévio, lá está o desejo. Raras pessoas o conseguem, após
longas disciplinas espirituais. Depois de ver Deus fica fácil. Em geral, a ação
cessa depois da visão de Deus. Raramente a ação continua, para ensinar, como
no caso de Narada.
O
Avadhuta também teve uma abelha como guru. A abelha trabalha arduamente por
muito tempo para acumular mel, mas não é ela que o aproveita. Vem um homem que
quebra os favos e leva o mel. O Avadhuta aprendeu com a abelha que é inútil
acumular: um homem religioso deve apoiar-se cem por cento em Deus. Não lhe é
permitido poupar.
Isso
não se aplica às pessoas que estão no mundo, com uma família para alimentar.
Elas precisam fazer provisões. Dizem que “O pássaro e o monge não acumulam17”,
mas mesmo o pássaro acumula quando tem filhotes, trazendo-lhes comida no bico.
Está
vendo, Bijoy? Se você encontrar um homem vestindo a guerua18
mas com uma bagagem bem arrumada e fechada com quinze nós, não confie nele!
Fico olhando os grupos de sadhus embaixo do banyan: dois ou três
descansam, um escolhe lentilhas, outro conserta sua roupa e eles dão as dicas
das boas casas onde mendigar19:
“Esse babu é um ricaço, dá tudo o que a gente quer, bolo, doces, um
monte de coisas boas” (todos riem).
B
— É verdade, senhor. Em Gaya chamam esses sadhus de sadhus-pote-de-cobre
(todos riem).
SR
— Quando chega o amor de Deus, a ação se desapega. Aqueles a quem Deus dá
um trabalho para fazer, que o façam! Agora chegou para você o momento de
renunciar a tudo e dizer: “Venha, minha alma, contemplemos ambos e que ninguém
se interponha”. Dizendo isso, o Mestre pôs-se a cantar com sua voz incomparável,
como uma chuva tranqüilizadora:
Em meu
coração quero guardar
A imagem
de Shyama, a Mãe.
Vem, ó
minha alma, contemplemos ambos,
E que
ninguém mais se interponha.
Vê, o
prazer é uma miragem,
Partamos
para um lugar solitário.
Que a língua
nos acompanhe
Para
chamar “Mãe, Mãe”.
(Sim, que
ela chame sem cessar).
Pensamentos
feios ou pensamentos baixos,
Que nenhum
deles ouse mostrar-se.
Conhecimento,
monta guarda,
Em
vigilante sentinela.
SR
(dirigindo-se a Bijoy) — Aquele que toma refúgio em Deus deve rejeitar a
vergonha, o medo, etc. É preciso livrar-se de pensamentos do tipo “Se eu dançar
ao som do Nome do Senhor, o que as pessoas vão dizer?” Expulse de seu coração
o desprezo, a vergonha e o medo. E também o orgulho de casta, os desejos
ocultos, o ódio. Tudo isso são correntes. Se a pessoa se livra delas, alcança
a Libertação.
Tire
essas correntes do ser humano (jiva) e você encontrará Deus (Shiva).
Prema, o amor supremo20
pelo Senhor, é uma coisa rara e preciosa. Tudo começa com bhakti, um
amor por Deus tão sólido quanto o da esposa pelo esposo. Um amor puro é muito
difícil de se obter. A alma que o obtém imerge em Deus. Depois vem o amor extático.
Ele torna a pessoa muda, sua respiração cessa e as funções do corpo
interrompem-se21,
como num atirador com fuzil que ao visar não pensa em mais nada e prende a
respiração.
Tendo
dito isso, o Mestre começou a cantar:
Oh, quando
virá o dia
Em que só
permanecerá o Nome (quando virá esse dia?)
Em que os
desejos se apagarão (quando virá esse dia?)
Em que o
corpo estremecerá de alegria (quando virá esse dia?)
4
Durante essa conversa, haviam entrado alguns convidados consideráveis: vários
pandits, altos funcionários, entre os quais um certo Sri Rajninath Ray.
O
Mestre dizia: “Quando vem o êxtase, a respiração pára. Quando Arjuna
esticava seu arco, só via o alvo — o olho do peixe e nada mais, nem mesmo uma
outra parte do peixe. Quando a mente está concentrada assim em uma única
coisa, a respiração cessa e a kumbhaka se faz espontaneamente”.
É
um dos sinais da visão de Deus: uma grande corrente que se precipita na direção
da cabeça, logo antes do samadhi e da visão divina22.
Ele
olhou para os recém-chegados e disse: “Aqueles que têm apenas erudição
religiosa sem amor pelo Senhor fazem discursos sem substância. Um certo pandit
Samadhyayi23
dizia “Deus é insípido, é o nosso amor que Lhe dá sabor”. Aquele que o Veda
chama de “essência de todo sabor” não teria sabor? Compreendemos
imediatamente que a pessoa que fala desse modo não sabe nada sobre a realidade
de Deus. São discursos vazios. Alguém dizia: “O estábulo do meu tio está
cheio de cavalos”. Adivinhava-se imediatamente que ele nunca tinha visto uma
estrebaria nem um cavalo (risos).
Toda
a glória do mundo — a riqueza, a celebridade, o respeito, tudo o que dá
origem ao orgulho — é coisa para alguns poucos dias. Não levaremos nada
disso conosco. Há um canto a respeito:
Pensa bem,
ó minha alma, presa na rede de Maya, não esquece a Mãe!
O que crês
que te pertence, terás de deixá-lo aqui.
Quando
morreres, tua bem-amada se afastará de teu cadáver.
Tudo isso
aqui é para durar dois ou três dias.
Terás de
deixar essa pose de patrão.
Verás que
o verdadeiro patrão é a morte.
Não
devemos orgulhar-nos do dinheiro. Você se acha rico, mas há outros mais ricos
que você e outros ainda mais ricos. Quando a noite cai, o pirilampo sai e diz:
“Sou eu que ilumino o mundo”. Mas logo que as estrelas aparecem ele se
esconde. Então as estrelas acham que elas iluminam o mundo, mas a lua aparece e
as estrelas ficam humilhadas. A lua pensa que inunda o universo com sua luz, mas
chega a aurora, sai o sol e ela nem é mais vista. Se os ricos pudessem dizer
isso consigo mesmos, seriam libertados de seu orgulho.
* Original I.6, tradução inglesa 12.
1 Adhar Sen (Diálogo 5, nota 28).
2 Na juventude de SR esse setor era ainda uma verdadeira selva.
3 Esse pandit tivera contato com SR por volta de 1864, ou seja, quase vinte anos antes desse diálogo.
4 Nessa época SR era muito pouco conhecido e tinha imenso desejo de partilhar sua experiência.
5 Este último foi um dos dois grandes teólogos que, por volta de 1866, reconhecera em SR as características de um avatar.
6 A história está contada mais detalhadamente na grande biografia de SR por Swami Saradananda, com a particularidade de que não se trata de Brahma mas de Vishnu.
7 Mais adiante veremos o próprio SR jogar no Ganges dinheiro e terra juntos.
8 O pandit Vidyasagar, escritor, educador e filantropo, o “patrão” de M (ver o Diálogo 3).
9 Precisamos lembrar aqui a teoria dos três modos do ser: tamas obscuro e brutal, rajas brilhante e orgulhoso, sattva doce e puro.
10 Diálogo 5.4; Diálogo 6.6.
11 Esse poema está traduzido no Diálogo 12.1. (“Ó minha mente, não sabes cultivar”). Trata-se de “conseguir cultivar o campo”, e o último verso (“se não o conseguires, chama Ramprasad para ajudar”) está interpretado de modo bem diferente aqui — a outra interpretação parece melhor: cf. o nº 101 na tradução de Michèle Lupsa (o texto também está um pouco diferente).
12 A mesma pergunta é feita no Diálogo 3.3.
13 Ver o Diálogo 2.8.
14 Precisamos lembrar os dois pólos do pensamento hindu: por um lado, Brahman, o Absoluto, o Uno, o princípio masculino (Purusha), o deus Shiva; por outro lado, a Força ou Energia (Shakti), a Ilusão (Maya), a multiplicidade, a Natureza (Prakriti), o princípio feminino, a deusa Kali.
15 O Bhagavata Purana, escritura fundamental do culto de Krishna; as invocações abaixo, que SR repetia em seu culto pessoal, são de origem vishnuísta.
16 Um vaishnava é um adorador de Vishnu ou de Krishna.
17 Tamas, rajas, sattva.
18 As aldeias natais de SR e Hriday.
19 Segundo uma tradição que remonta ao próprio M, “ele” seria M e “a obra” consiste em anotar as palavras de SR.
20 A alusão está um pouco diferente no original. Esta foi emprestada da tradução de Swami Nikhilananda.
21 Pratap Chandra Hazra vivia no templo de Dakshineswar desde muito tempo, tolerado por SR. Brâmane do interior fugido de seus credores, pai de família negligente, com sua barba majestosa, cobiçoso, mentiroso, vaidoso, fazia pose de mestre espiritual e vedantista realizado, e aliás tinha inteligência e conhecimentos teológicos. Naren gostava dele, mas os discípulos em sua maioria sentiam-se muito irritados.
22 A cunhada e a sogra de Radha (ver o Diálogo 2, nota 25).
23 Jagaddhatri, sentada sobre um leão que segura um elefante com suas garras.
24 Quantas pessoas fazem essa pergunta!
25 Só usado pelos homens.
26 A raiz da palavra yoga significa “união, junção”.
27 Essa imagem ocupa a posição central no templo de Dakshineswar.
28 Ver Diálogo 2, nota 8.
30 A reflexão precedente sobre o avatar levou à menção de Chaitanya, o grande místico, considerado como uma “descida” de Deus. Portanto, existe aqui um jogo com o sentido dos nomes de Chaitanya e de seus dois principais companheiros, Nityananda e Advaita Goswami.
31 Uma idéia importante do hinduísmo: a da escolha de uma forma predileta (Ishta) entre os aspectos possíveis da divindade.
* Original I.7, tradução inglesa 13.
1 Literalmente “Eu sou Kha”. Sobre Krishnakishor, ver o Diálogo 2.6.
2 Sobre Hriday, o sobrinho de SR, ver o Diálogo 1, nota 50.
3 Durante longos meses de inconsciência extática.
4 Sobre Adhar Sen, ver o Diálogo 5, nota 28.
5 Vishnu.
6 Após a visão de Deus, a alma alcança a libertação, mas o efeito das ações passadas prossegue até a morte do corpo.
7 Em outra versão se diz que ele fora condenado a renascer seis vezes com um só olho e que sua libertação anulara as cinco outras. Isso ilustra a idéia de retribuição segundo o hinduísmo.
8 Os cinco irmãos heróis do Mahabharata.
9 O “Capitão” (Diálogo 4, nota 13) é um dos mais antigos fiéis de SR, o qual deve ter conhecido por volta de 1872-73.
10 Bachelor of Arts, primeiro grau dos estudos universitários.
11 Alusão a uma parábola familiar, a dos brâmanes que se calam quando seu estômago está cheio, assim como se calam quando seu coração está repleto pela realização de Deus (Diálogo 5.6).
12 SR gosta muito que lhe contem suas próprias parábolas. Veremos exemplos de pequenos exames a que ele submete M.
* Chakora: pássaro mítico semelhante à perdiz, e que segundo as lendas antigas alimenta-se do néctar dos raios da lua.
13 Diálogo 8, nota 21.
14 Mais uma vez, o Capitão “devolve” a SR uma de suas frases familiares.
15 Para um hindu ortodoxo, um inglês (ainda que vice-rei) é um sem-casta, um intocável.
* Original I.8, tradução inglesa 14.
1 A divisão à qual pertencem Vijay e Shivanath (ver Diálogo 4).
2 Um brahmo rico e idoso, admirador fervoroso de SR (ver Diálogo 8).
3 Literalmente, “como um filete de óleo”.
4 Provavelmente Shivanath evita Ramakrishna.
5 Traduzido segundo Swami Nikhilananda. O original é menos explícito.
6 Este é o leitmotiv que resume a espiritualidade de Ramakrishna. Ver o Diálogo 2.6.
7 “Deus” no sentido usual do termo, em oposição ao Brahman sem atributos, o Uno sem segundo da Vedanta.
8 Muito próximo de Keshav, Pratap Chandra Majumdar o sucederá na chefia de sua divisão do Brahmosamaj.
9 O santo rei pai de Sita. Ver o Diálogo 2, nota 21.
10 Expressão estereotipada para designar as austeridades (nota da tradução de Swami Nikhilananda).
11 Diálogo 1.5, assim como para a “manteiga” mais adiante.
12 Diálogo 2.5.
13 Importante lugar de peregrinação vishnuísta.
14 Estamos quase um ano depois do Diálogo 4. Vijay iniciou uma evolução que o levou de volta ao hinduísmo ortodoxo.
15 Eremita hindu.
16 Ave de rapina européia da família dos falcônidas.
17 Esse provérbio está em hindi.
18 Diálogo 3, nota 5.
19 Essa imitação dos sadhus está em hindi e devia ser muito engraçada.
20 Distinguem-se três tipos de amor: bhakti (devoção), bhava (amor extático) e prema (amor supremo).
21 Trata-se da kumbhaka, estado de concentração e morte aparente descrito pelos tratados de yoga e que ocorre sem ser buscado.
22 É o despertar da kundalini. Atualmente, as livrarias do Ocidente têm prateleiras cheias de livros sobre esse assunto!
23 Notar que o discurso se torna bem mais cortante com a chegada dessas pessoas respeitadas. Em sua história do Brahmosamaj, Shivanath Sastri refere-se a Samadhyayi como “a renowned Vedic scholar of the time” (um sábio védico famoso).
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