Templo de Kali (jardins dos templos de Daksneswar) onde Sri Ramakrishna vivia.

 

QUARTO ENCONTRO

9  O dia seguinte, 6 de março, ainda era feriado, e M voltou aproximadamente às três horas. O Mestre estava em seu quarto, uma esteira cobria o chão, e Norendro, Bhobonath35 e alguns outros estavam sentados ali, todos com dezenove ou vinte36 anos. O Mestre estava sentado na pequena cama de madeira, e falava alegremente com todos aqueles rapazes.

Vendo M entrar no quarto, o Mestre desatou a rir, e virando-se para os rapazes, disse-lhes: “Olhem! Aí está ele de novo!” Como estava rindo, eles começaram a rir também. M avançou e prosternou-se diante do Mestre37 . Até então, inclinara-se diante dele com as mãos juntas, como o fazem as pessoas educadas à inglesa, mas naquele dia aprendeu a prosternar-se como um hindu. Depois tomou assento. O Mestre explicou então a Norendro e aos outros o que o fizera rir: “Ouçam! Um dia, alguém deu uma pílula de ópio a um pavão às quatro horas da tarde, e no dia seguinte às quatro horas em ponto, o pavão voltou para buscar sua pílula”. Todos riram de novo. M pensou: “Ele está certo outra vez!” De fato, a noite inteira e o dia inteiro, M só havia pensado numa coisa: “Quando vou voltar? Não quero ir a nenhum outro lugar, preciso voltar lá”, como se o estivessem puxando por uma corda!

O Mestre fazia brincadeiras com os rapazes como se fosse da idade deles, e ondas de enormes gargalhadas percorriam a assistência. Dir-se-ia um bando de adolescentes numa festa de aldeia. M perguntava-se: “Será que foi realmente ele que eu vi em êxtase ontem, repleto de um extraordinário amor a Deus? Será realmente o mesmo que agora se comporta de maneira tão simples? O mesmo que no primeiro dia me fez reprimendas, perguntou ‘E você, você é instruído?’, falou-me das duas verdades de Deus com e sem forma? Ele que me disse que Deus é a única realidade e todo o resto passa? Que me disse para viver com a atitude da criada?”

O Mestre divertia-se muito, e de vez em quando lançava uma olhada para M. Vendo que este refletia em silêncio, dirigiu-se a Ramlal: “Como está sério! Ele é um pouco mais velho que os outros, então se cala quando todos se divertem”. Naquela época M tinha aproximadamente vinte e sete anos.

A conversa mencionou Hanuman, o perfeito servo de Deus, cuja imagem estava pendurada na parede. O Mestre disse: “Vejam como Hanuman é extraordinário! A riqueza não o interessa, nem a fama, nem a saúde, nada disso — só o amor do Senhor. Quando ele foi pegar a arma mágica que Ravana38 havia ocultado no pilar de cristal, a esposa de Ravana trouxe todo tipo de frutas, pensando que o macaco ficaria tentado e assim ela aproveitaria para retomar a arma. Mas Hanuman não era tão ingênuo, ouçam o que ele responde:

 

Que necessidade tenho eu de tuas frutas?

Obtive uma fruta melhor que todas as outras,

A fruta da libertação, colhida na árvore de Rama,

Essa árvore que concede todos os desejos!

Ao pé dessa árvore tomei refúgio.

A fruta que se deseja é a fruta que se consegue,

E a fruta que acabo de recolher em tua casa

Será para vós uma fruta amarga.

 

O Mestre canta e entra em êxtase: com o corpo rígido novamente, com o olhar fixo, sentado, como na foto que temos dele. Os rapazes que se divertiam ruidosamente  calaram-se e olham compenetrados para ele. Pela segunda vez, M é testemunha daquele estado. Um momento depois, ocorre uma mudança: o corpo se distende, os lábios sorriem, os sentidos retomam suas funções, lágrimas de alegria correm no canto dos olhos, e o Mestre diz “Rama, Rama”. M pensou: “Um momento atrás esse homem admirável divertia-se com os jovens, como se fosse um menino de cinco anos!”

O Mestre havia recobrado os sentidos e comportava-se como uma pessoa comum. Dirigiu-se a Norendro e M: “Gostaria muito de ouvir vocês dois discutirem em inglês”. Eles puseram-se a rir e começaram a falar juntos, mas em bengali. Na presença do Mestre, M perdera definitivamente suas faculdades de discussão, e aliás, discutir o quê? Por mais que o Mestre insistisse, não houve discussão naquele dia.

 

10  Soaram as cinco horas, e os devotos se foram uns após os outros. Ficaram M e Norendro. Este pegou seu pote para água e foi na direção do grande tanque do jardim para refrescar as mãos e o rosto. M passeou aqui e ali entre os templos, depois dirigiu-se também para o tanque. Norendro estava de pé na escada, com o pote de cobre na mão, e Sri Ramakrishna estava perto dele, dizendo-lhe: “Por que você não vem mais vezes? Depois dos primeiros encontros, é preciso passar para as coisas sérias, como quando se arranja um casamento! — M e Norendro estouraram de rir — Quando você vai voltar?” Norendro, como bom discípulo do Brahmosamaj, era apegado à estrita verdade. Respondeu: “Assim que puder”.

Voltaram ao quarto, passando em frente ao bangalô dos proprietários. Perto dali, o Mestre dirigiu-se a M: “Os camponeses que vão comprar um boi na feira sabem distinguir um bom boi de um ruim. Eles põem a mão debaixo do rabo do boi. Se não reage, é porque não vale nada. Se pula e se debate, é um boi bom, pode-se comprá-lo. Norendro é desse tipo. Tem muita energia”. Começou a rir e disse: “Existem pessoas que são moles como a sopa de arroz, que faz bluc, bluc!”

A tarde caía e ele foi tomado pelo pensamento de Deus; deixou M, dizendo: “Vá discutir um pouco com Norendro, depois você me diz o que acha”.

Um momento mais tarde, com efeito, depois do culto, M encontrou Norendro à beira do Ganges. Começaram a conversar. Norendro lhe disse que era membro do Brahmosamaj, que havia começado a universidade, etc.

A noite caíra, e M despediu-se. Mas não conseguia ir embora, e saiu à procura do Mestre. Sentia tanta vontade de ouvi-lo cantar! Percorreu os lugares. Tudo estava às escuras. No templo de Kali brilhavam duas lâmpadas e em frente, no vasto natmandir*, havia também um pouco de luz. O Mestre estava ali, sozinho, caminhando de um lado para o outro. M desejava ouvi-lo, como uma serpente deseja a música do mágico. Aproximou-se e perguntou timidamente: “Ainda vamos cantar hoje?” O Mestre saiu de sua distração e disse: “Não, por hoje chega”. Depois teve uma idéia. Disse: “Escute, eu vou a Calcutá na casa de Boloram39 , é só você ir, a gente vai cantar”. — “Está bem, senhor”. — “Você conhece? Boloram Boshu?” — “Não, senhor. — Boloram Boshu... sua casa em Boshpara? — Está bem, senhor, eu me informarei.”

O Mestre e M caminhavam pela grande sala, um ao lado do outro. De repente Sri Ramakrishna perguntou a M: “O que você acha de mim? Quanto por cento40 de sabedoria eu tenho na sua opinião?” M respondeu: “Não sei o que quer dizer ‘por cento’, mas quanto ao amor, a fé, a sinceridade, a renúncia, ainda não encontrei ninguém como o senhor”. O Mestre sorriu. Após esse diálogo, M prosternou-se diante do Mestre e despediu-se.

Já estava na porta de saída quando lhe veio um pensamento que o fez dar meia volta. Retornou à sala de dança onde, na penumbra, o Mestre continuava caminhando de um lado para o outro — sozinho com seus pensamentos, como na floresta um leão solitário, independente, desapegado. M contemplava em silêncio aquele espetáculo impressionante.

“Você voltou?” — “Voltei: pensei que é uma casa de ricos. O que eu iria fazer lá? Prefiro não ir. Posso voltar para vê-lo aqui?” — “Ah, não! Por quê? Você vai dizer simplesmente que quer me ver e alguém o levará para junto de mim!” M disse: “Então está bem, senhor”, saudou o Mestre e saiu novamente.

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TRÊS LEMBRANÇAS

No início da quinta parte dos “Diálogos” figuram algumas lembranças breves referentes ao mesmo período. A primeira descreve com poucos detalhes a sessão de kirtan na casa de Bolorama, de quem acabamos de ouvir falar — a primeira à qual M assistiu. A brevidade do texto parece indicar que M ainda não tomava notas detalhadas.

 

11  Como o Mestre havia dito “Irei a Calcutá, em casa de Boloram, vá encontrar-se comigo”, M lá foi. Era sábado, 11 de março de 1882, cerca de oito ou nove horas da manhã, no dia da festa do Carro. Rama, Monomohon41, Rakhal42, Nittogopal43 e numerosos outros devotos rodeavam o Mestre. Todos cantaram o nome de Hari até ficarem embriagados, e muitos atingiram estados de exaltação. Nittogopal entrara em êxtase, e seu peito estava vermelho-sangue44. Quando todos se sentaram, M foi prosternar-se diante do Mestre. Viu então que Rakhal estava estendido, sem consciência externa; era a segunda vez que atingia assim o êxtase. O Mestre veio passar-lhe a mão no peito, dizendo “paz, acalme-se”. Rakhal morava então em Calcutá na casa dos pais, e vinha de vez em quando ver o Mestre em Dakshineswar. Naquela época, freqüentava a escola do Sr. Biddashagor45 em Shempukur. Depois, todos os devotos sentaram-se na varanda e compartilharam o prasad46. Boloram permanecia humildemente de pé, como um serviçal. Não se poderia imaginar que ele fosse o dono da casa.

M não falou muito com os outros, pois ainda não conhecia ninguém, exceto Norendro, que encontrara em Dakshineswar.

 

12  Alguns dias mais tarde, M estava sentado perto do Mestre em Dakshineswar, na escada dos templos de Shiva, por volta das quatro ou cinco horas da tarde. O Mestre estava em êxtase.

O Mestre acabava de descansar em seu quarto, estendido no chão. Outrora havia sempre alguém de plantão para zelar por ele47, mas desde a demissão de Hridoy48 encontrava-se numa situação pouco confortável. Com a chegada de M, saíram ambos conversando e sentaram-se nos degraus dos templos de Shiva, em frente ao templo de Radha e Krishna. Subitamente, o olhar do Mestre voltara-se para aquele templo e ele entrara em êxtase.

Estava falando com a Mãe do Universo: “Mãe, todos eles dizem ‘É meu relógio que está com a hora certa’. Cristãos, brahmos, hindus e muçulmanos, cada um acha que a sua religião é a verdadeira religião. Na realidade, Mãe, nenhum desses relógios dá a verdadeira hora. Quem poderia Te conhecer realmente? Mas se alguém Te chama com todo o seu desejo e obtém Tua graça, qualquer um desses caminhos o levará a Ti. Mãe, leva-me para ver como os cristãos Te invocam em suas igrejas! Mas o que vão dizer as pessoas se eu entrar lá? E se criarem caso? E se depois não me deixarem mais entrar no Teu templo? Então Tu me deixarás ver a igreja só da porta.”

 

13  Outra vez, o Mestre estava sentado em seu quarto, sobre a pequena cama, com o rosto sorridente. M acabava de chegar com o Sr. Kalikrishno49. M não lhe dissera onde o levaria: “Conheço um bom comerciante de vinhos, venha comigo; eles têm um tonel grande”. Foi somente ao chegar que ele explicou tudo ao seu amigo, e ambos se prosternaram diante do Mestre50. Riram muito da história, e o Mestre também.

O Mestre lhes disse: “A alegria do louvor, a alegria do êxtase, isso é que é o verdadeiro vinho; o vinho do amor. A meta da vida humana é o amor a Deus. E o caminho da devoção é o melhor de todos. Conhecer Deus pela via da discriminação é muito difícil”. Depois cantou um canto de Ramprasad51 :

 

Quem pode compreender Kali?

   Ela escapa aos olhares dos seis pontos de vista.

A alma próxima do alvo

   Sabe que Kali é idêntica ao Absoluto.

Em tudo o que acontece,

   Revela-se a vontade da Jogadora.

Na matriz de Kali,

   Tomou forma a imensidão do universo.

Só o olhar de Shiva

   Tem o poder de discernir Sua natureza.

O yogui A contempla,

   Entre o lótus da base e o do vértice52.

Entre suas mil pétalas,

   Unem-se os dois cisnes53 , macho e fêmea.

Zombam, diz Prasad,

   De quem deseja atravessar o oceano a nado.

O coração pode conhecer Kali,

   Mas a mente é um anão que deseja agarrar a lua!

 

O Mestre repetiu: “Sim, o objetivo da vida é amar a Deus. Como em Brindabon54 os jovens pastores e as pastoras (as gopis) amavam Krishna. Quando Ele deixou Brindabon para tornar-se rei de Mathura, os pastores vagavam pela floresta chorando, na dor de ficarem separados dEle”. O Mestre ergueu o olhar para o céu e pôs-se a cantar.

 

Vi um jovem pastor — sob os galhos de uma jovem árvore,

Carregando um bezerro recém-nascido, repetindo:

“Onde Tu estás, meu irmão?

Para onde foste, Krishna55?”

Ele só conseguia dizer “Krish”,

De tal modo o pranto sufocava sua voz,

De tal modo seus olhos estavam cheios de lágrimas.

 

Os olhos de M encheram-se de lágrimas ao ouvir o Mestre cantar assim.

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DIÁLOGO 2*

NO BARCO COM KESHAV: 27 de outubro de 1882

 

Este diálogo vem como segundo na tradução de M, e nós o deixamos nessa posição (invertendo a ordem cronológica) em razão de seu encanto excepcional, dado o cenário (o passeio no Ganges) e a profunda amizade que ligava Ramakrishna e Keshav — amizade que espantava seus contemporâneos e pode ainda espantar-nos. Keshav não deixa de valorizar Ramakrishna diante de seus próprios discípulos, e é por isso que algumas parábolas de Ramakrishna alcançam aqui sua forma mais bela. Percebemos também a amizade entre Ramakrishna e Vijay, que reencontraremos em seguida.

 

1  Estamos na sexta-feira, 27 de outubro de 1882, dia de Lakshmi. O Mestre está sentado em seu quarto no templo de Kali, conversando com Bijoy1, Horolal e outros, quando alguém entra avisando a chegada de Keshob num barco2 em frente ao cais. E logo alguns discípulos de Keshob chegam e saúdam o Mestre: “Senhor, viemos convidá-lo para um passeio no rio; Keshob Babu3 está no barco, foi ele quem nos mandou”.

São quatro horas da tarde; o Mestre entra numa canoa para ir a bordo, acompanhado por Bijoy4. Nem bem se acomoda no barco, entra em êxtase.

De pé na ponte, M o via aproximar-se. Por volta das três horas ele fora ao encontro do grupo de Keshob5 em Calcutá, com um enorme desejo de assistir ao seu encontro com o Mestre, de testemunhar sua alegria mútua, e acompanhar sua conversa. Pela sua eloqüência e pureza de caráter, Keshob se tornara o herói da juventude de Bengala, e numerosos eram aqueles que, como o próprio M, amavam-no e admiravam-no de todo seu coração.

 

Keshob havia sido educado à inglesa, conhecia bem o pensamento e a cultura do Ocidente e rejeitava o culto dos deuses e deusas hindus, que chamava de idolatria. Mas por outro lado, coisa admirável, tinha uma grande veneração por Sri Ramakrishna e ia sempre a Dakshineswar para encontrá-lo. Isso parecia um mistério para muitas pessoas (M em particular), que tentavam entender como duas mentes tão diferentes podiam compreender-se. Como Keshob, o Mestre adorava Deus sem forma, mas aceitava também as formas divinas. Reconhecia o Absoluto sem atributos, mas oferecia flores e pasta de sândalo às imagens dos deuses e deusas, cantava, dançava e entrava em êxtase na presença deles. Visto do exterior, não parecia um sannyasin: dormia numa cama, usava dhoti* com orla vermelha, camisa e chinelos. Mas mentalmente era completamente desapegado, sem família nem posses, e era por isso que as pessoas o chamavam paramahamsa. Ao contrário, Keshob, que pregava Deus sem forma, não rejeitava a vida em família, tinha esposa e filhos, dava conferências em inglês, escrevia nos jornais, e era um homem rico que cuidava de seus negócios.

 

Keshob e os brahmos estavam reunidos na ponte do barco para admirar o espetáculo dos templos: no primeiro plano, o cais e a majestosa escada de pedra que descia até o Ganges. No alto da escada, paralelamente ao rio, a fileira dos doze pequenos templos de Shiva, seis de cada lado. Atrás destes, destacando-se no céu azul e luminoso do outono, as torrezinhas brancas do templo da Mãe, e ao norte um pavilhão para música e as árvores grandes do panchavati. Ao sul, o outro pavilhão de música, mais árvores grandes e, entre os dois, ao longo do Ganges, um jardim coberto de flores. O céu azul se refletia no rio, o mundo estava impregnado pela doçura do outono, e interiormente o coração dos brahmos correspondia àquela atmosfera. O céu acima, a beleza dos templos em frente, aos seus pés o Ganges sagrado ao longo do qual, desde milênios, os sábios da Índia meditavam no Senhor — e vindo até eles, em êxtase no barco, aquele homem incomparável que encarnava toda a religião da Índia. Quantas vezes numa vida pode-se assistir a tal espetáculo? Que coração de pedra não ficaria em alvoroço?

 

2  O barco aproximava-se, e os brahmos acorriam para olhar o Mestre em êxtase. Keshob estava muito ansioso por vê-lo em segurança no barco. Fizeram-no subir bem devagar e com muita dificuldade. Ele apoiava-se num devoto e mal podia mexer as pernas. Entraram na cabine, Keshob e os brahmos o saudaram respeitosamente, mas ele não reagiu. No meio da cabine havia uma mesa e algumas cadeiras, e fizeram-no sentar-se em uma delas; Keshob pegou uma, Bijoy também, e os outros brahmos sentaram-se no chão, pelo menos aqueles que conseguiram lugar — muitos não puderam entrar, e comprimiam-se na porta para olhar. O Mestre estava de novo completamente absorto, sem nenhuma consciência externa, e todos os olhos estavam fixos nele.

Keshob achava que havia gente demais no local e que isso era penoso para o Mestre. Também estava descontente por ver Bijoy: este se separara dele quando do casamento de sua filha, juntara-se ao Sadharan Brahmosamaj, e o atacara publicamente várias vezes. Levantou-se e foi abrir a escotilha.

Os brahmos continuavam a olhar o Mestre, que ia saindo pouco a pouco de seu êxtase. Falava sozinho, com uma voz indistinta: “Mãe, por que me trouxeste aqui? Será que eu posso tirá-los de suas barreiras?” Talvez ele visse que os mundanos ficam fechados por barreiras, com as mãos e os pés atados pelas preocupações do mundo; não só não podem sair como também sequer adivinham a luz do lado de fora, e crêem que o objetivo da vida humana é o bem-estar físico, o sexo e o dinheiro.

Enquanto ele recobrava os sentidos pouco a pouco, Nilmadhod Babu de Ghazipur e outro brahmo começaram a falar de Pawhari Baba6. Um brahmo dirigiu-se ao Mestre:

- Senhor, eles foram ver Pawhari Baba em Ghazipur. Ele é assim como o senhor!

O Mestre ainda não conseguia falar. Respondeu com um sorriso.

- Senhor, Pawhari Baba colocou a sua foto na parede do quarto dele.

O Mestre sorriu novamente e mostrou com o dedo seu próprio corpo, dizendo: “Uma capa!”

 

3  Talvez ele quisesse dizer: como a capa que cobre a almofada, o corpo envolve a alma, o perecível envolve o imperecível. Então para que pendurar uma foto do envelope? Para que demonstrar respeito ao que é perecível? É melhor prestar culto ao Senhor, o guia interior do homem, que mora em seu coração*.

O Mestre voltara ao estado normal, e começou a falar.

SR — Dizem que a morada preferida do Senhor é o coração de seu adorador. Ele está por toda parte, mas é ali que gosta de ficar. Como um grande proprietário que pode percorrer todo o seu domínio, mas gosta de ficar numa determinada sala onde recebe as pessoas. Assim, o coração do devoto é a sala onde reside o Senhor.

Essas palavras alegraram os brahmos. O Mestre prosseguiu:

- Aquele que os vedantistas7 chamam Uno, Aquele que os yoguis chamam Alma, é Esse mesmo que os devotos chamam de Senhor. Quando um brâmane celebra o culto, chamam-no sacerdote; quando ele prepara a comida, chamam-no brâmane-cozinheiro. Os vedantistas discriminam sempre: o Absoluto (Brahman) não é nem isso nem aquilo; nem o corpo nem o espírito, nem o mundo. Assim, pouco a pouco, eliminando o essencial, a mente se imobiliza, as construções mentais se desfazem, o êxtase (samadhi) se produz, e então vem o conhecimento do Uno (Brahman). Aquele que conhece Brahman sabe que Ele é a realidade, que o universo é uma ilusão, que os nomes e formas são apenas sonhos. Acontece que a boca não consegue expressar o Uno, e também não convém chamá-Lo de Deus Pessoal. Assim fala o vedantista.

O devoto, ao contrário, não rejeita nada. Para ele o estado de vigília também é uma realidade, ele não diz que o mundo é um sonho, mas que o universo é a glória do Senhor: o céu estrelado, a lua, o sol, as montanhas e o oceano, o homem e os animais. Tudo isso Ele criou. Ele está dentro do coração e também fora do coração. Chegando ao termo, o devoto percebe que o próprio Deus tomou a forma dos vinte e quatro princípios cósmicos8, dos seres vivos e do universo. Mas a alegria do devoto é comer açúcar, e não transformar-se em açúcar (risos). Vocês compreendem seu estado de espírito? Ele diz: “Ó Senhor, Tu és o mestre e eu o servo, Tu és a mãe e eu o filho, Tu és meu pai e minha mãe, Tu és o todo, eu sou a parte”. Mas ele não gosta de pensar “eu sou o Uno, eu sou Ele”.

O yogui também se esforça para alcançar a Alma suprema. Seu objetivo é a união entre a alma individual e a Alma Suprema. Ele procura desligar a mente dos objetos e fixá-la na Alma Suprema. A primeira condição é buscar a solidão, adotar uma postura firme e imóvel, e meditar concentrando a atenção num único ponto.

Mas existe apenas uma única realidade, as diferenças estão só na expressão; o Absoluto do vedantista, a Alma Suprema do yogui e o Senhor do devoto são um só!

 

4  O barco havia tomado a direção de Calcutá, mas aqueles que estavam sentados na cabine junto com o Mestre e o escutavam em silêncio não se deram conta e não disseram nada: uma abelha que sorve o néctar não zumbe.

Pouco a pouco os templos desapareceram ao longe. A água com reflexos azuis, agitada pelas rodas da embarcação, formava grandes ondas de espuma cujo ruído chegava até a cabine. Mas os devotos não ouviam. Haviam sido cativados por aquele homem sorridente, radiante de alegria, que não conhecia nem possuía nada além de Deus. Ele prosseguiu:

- O vedantista que busca o absoluto diz o seguinte: os processos de criação, preservação e destruição, o ser individual, o mundo, tudo isso é o jogo da Energia divina9 . Analisando-a, descobre-se que é apenas um sonho: só o Absoluto (Brahman) é real, todo o resto é irreal, e a própria Energia é irreal, um sonho. Muito bem, mas mesmo que você analise isso mil vezes, é só no êxtase (samadhi) que você escapa da Energia. Logo que você sai dele, o simples pensamento “estou meditando”, “estou analisando” coloca você novamente sob o domínio de sua lei, em seu reino!

Desse modo, não há diferença entre o Uno e sua Energia (Shakti). Se você aceitar um terá que aceitar o outro, como o fogo e seu poder de queimar: se você pensa no fogo, pensa também no poder de queimar. Você não pode conceber esse poder sem fogo, nem um fogo que não queimasse. Se você pensa no sol, pensa em sua luz: daria para imaginar o sol sem seus raios de luz? E o leite? É totalmente branco. A brancura do leite não vem sem o leite, nem o leite sem sua brancura. Da mesma forma, o Absoluto é inseparável de sua Energia, e a Energia inseparável do Absoluto. O Jogo10 do universo é inseparável da Eternidade, e a Eternidade inseparável do Jogo.

É a Mãe11 que é a Jogadora, que realiza a criação, a preservação e a dissolução. Seu Nome é Kali. Ela é Brahman, o Absoluto, e Brahman é Kali. Existe apenas uma Única Realidade. Quando penso nEla como inativa, fora do Seu trabalho de criação, preservação e destruição, então eu A chamo Brahman. Quando Ela realiza toda essa obra, eu A chamo Kali, eu A chamo Energia, Shakti. Um único ser com vários nomes.

É como um reservatório de água com várias escadas. Por uma delas descem os hindus para buscar água, e eles a chamam jol; pela segunda descem os muçulmanos, e eles a chamam pani, e por uma outra os ingleses que a chamam water. Mas é sempre a mesma água. Ora, Ele também pode ser chamado Allah ou God, outros dirão Rama, Hari, Jesus, Durga.

Keshob sorriu e perguntou: “Sob quais formas Kali joga o Seu Jogo? Por favor, explique-nos de novo12 !”

SR (sorrindo) — Ela joga de muitas maneiras! Ela pode ser Kali a Grande, Kali a Eterna, Kali a Terrível, Kali a Salvadora, Kali a Azul (Shyama). Nos Tantras13 se fala de Kali a Poderosa e Kali a Eterna. Quando a criação é dissolvida e não há nem lua, nem sol, nem estrelas, nem planetas, nem terra, nada a não ser uma escuridão profunda, então Kali a Grande, a Mãe sem forma, está ali sozinha — Kali reunida a Kala14 . Chamamos Shyama, “a Azul”, a Mãe cheia de ternura, oferecendo suas dádivas e trazendo coragem e proteção; cultos lhe são oferecidos nas famílias. Em caso de epidemia, fome, seca, inundação, invoca-se Kali a Salvadora. Kali a Terrível encarna a destruição e a ruína, mora nos campos de cremação, em companhia de cadáveres, chacais, demônios femininos aterrorizadores. O sangue escorre de sua boca; ela usa um colar de crânios e um cinto de mãos humanas.

Quando o mundo é aniquilado, por ocasião da grande dissolução, é a Mãe que preserva as sementes da criação. Como uma boa dona-de-casa que conserva em sua cozinha um vidro grande, cheio de pequenas coisas que talvez possam servir uma dia: um osso de lula, pílulas azuis, um saquinho com sementes de abobrinha e moranga (Keshob e os outros riem), da mesma forma a Mãe reúne as sementes da próxima criação. Então a Shakti Primordial tira o universo de seu próprio ser, depois estabelece nele a Sua morada. Nos Vedas se diz urnanabhira, ou seja, a aranha e sua teia. A aranha tece o fio a partir de sua própria substância, depois instala-se no centro de sua teia. Do mesmo modo Deus contém o mundo e fica contido nele.

Kali é realmente negra15 ? Pode parecer negra de longe, mas é só uma aparência. O céu parece azul de longe, mas de perto o ar é incolor. A água do oceano parece azul de longe, mas se a pegarmos na mão veremos que é transparente.

Tendo dito isso, o Mestre ficou como que embriagado, e cantou um hino à Mãe.

 

Por que chamá-La Negra, Aquela que ilumina o coração...

 

5  SR (a Keshob) — É Ela que nos acorrenta, e é Ela também que nos liberta! Ela é a Feiticeira (Maya) que prende o mundano com os laços do sexo e do dinheiro, mas é a Sua graça que traz a libertação. Ela é “Tara, Aquela que destrói as correntes do mundo”.

Tendo dito isso, pôs-se a cantar um canto de Ramprasad16, com sua voz incomparável:

 

O mundo é a praça do mercado, onde Shyama solta pipas.

O vento que as levanta é a esperança, a corda é a magia da Mãe,

A carcaça é feita de ossos, uma maravilha de armação,

E o tecido que se desenrola é o corpo de um homem vivo.

Na corda o vidro agudo, são todas as preocupações do mundo.

Entre cem mil pipas, uma ou duas rompem sua linha,

E a Mãe alegra-se, ri batendo palmas!

A graça soprou sobre a minha, diz Prasad. Ela levanta vôo.

O vento do sul a levará para a outra margem do oceano.

 

Ela brinca, e o mundo é Seu brinquedo! É Ela que concede os desejos; Ela distribui a alegria, a feiticeira!  E Ela dá a libertação a um homem em milhares.

UM BRAHMO — Senhor, para libertar-nos todos bastaria que Ela o quisesse. Então por que nos mantém atados ao mundo?

SR — É assim. Ela quer que todos brinquem juntos. É como quando as crianças brincam: enquanto estão tocando a mão da “avó”, ninguém pode pegá-las e elas podem descansar. Mas se todas se refugiassem junto da avó, não haveria mais brincadeira. Então a avó as obriga a deixá-la, para que corram. A brincadeira é seu prazer, e é assim que ela ri, batendo palmas, e só deixa escapar um ou dois participantes! (Todos riem).

Ela olha a alma piscando um olho e lhe diz: “Vá dar uma voltinha no mundo!” Não é culpa da alma! Quando chega o momento, a Mãe fica com pena e chama-a de volta, liberta-a da cegueira do mundo e deixa-a tomar refúgio a Seus pés de lótus.

Novamente o Mestre cantou uma canção de Ramprasad, que descreve uma alma prisioneira fazendo censuras à Mãe:

 

Ó Mãe, o que me desola

É que apesar de meus olhos abertos,

E embora eu seja Teu filho,

Sou roubado em minha casa.

Queria repetir Teu Nome,

E o tempo passa inutilmente.

Agora eu Te compreendi!

Queres tomar sem nada oferecer!

Vou devolver-Te o que dás,

Responderei se me chamares,

É culpa Tua e não minha!

Honra e vergonha, amargo e doce

Beleza e feiúra, tudo vem de Ti!

Prasad diz: são presentes.

Piscando os olhos Tu dás,

E giras a roda do mundo.

 

O homem esquece tudo por influência de Sua Magia17 .Vocês ouviram Ramprasad? Ela pisca e faz girar a roda.

UM BRAHMO — Senhor, é preciso renunciar a tudo para conhecer Deus?

SR — Claro que não! Por quê? Você está muito bem do jeito que está! Você tem o externo e o interno, o açúcar e o melado*. Você conhece o jogo do nax? É preciso chegar a dezessete pontos. Eu ultrapassei o total, estou queimado e me fizeram sair do jogo! Vocês são mais espertos e têm dez, cinco ou seis, então vocês podem continuar, vocês não estão queimados. O jogo precisa continuar (risos).

Afirmo-lhes que não há mal algum em viver em família, com a condição de manter a mente voltada para Deus — senão não dá. Fazer o seu trabalho com uma mão, segurar a mão do Senhor com a outra e, quando o trabalho está terminado, estender-lhe as duas mãos.

Tudo está na mente. As algemas estão na mente, a liberdade na mente. A mente toma a cor da tinta na qual é mergulhada. Como o tecido na cuba do tintureiro. Quando ele põe tinta vermelha, o tecido sai vermelho, tinta azul ele sai azul, tinta verde ele sai verde. Quem aprende inglês logo começa a misturar palavras inglesas no seu bengali, foot-fat-it-meat! (risos). Põe botinas e assobia ao caminhar. A cada instante um pandit cita versos em sânscrito. Se sacudimos um pandit, caem versos em sânscrito. Se você anda com vagabundos, pega o modo de falar deles — e se visita os devotos (bhaktas), vai ficando impregnado pela idéia de Deus e tudo o que a acompanha.

A mente pode tomar diversas atitudes. Um homem tem esposa e filhos. Ama sua esposa como esposa e seus filhos como filhos. Uma só mente, duas maneiras diferentes de amar.

 

6  Escravidão e libertação vêm ambas pela mente. Sou livre! Quer esteja no mundo ou na solidão das florestas, quem poderia me prender? Sou filho de Deus, filho do Rei dos reis, ninguém me acorrentará. Dizem que se um homem for picado por uma serpente e pensar com força “não existe veneno”, então o veneno não agirá. Da mesma forma, se alguém pensar com fé “sou livre, nada me prende”, será libertado.

Uma vez alguém me deu um livro cristão e eu lhe pedi para ler um pouco para mim. Pecado e só pecado! (Dirigindo-se a Keshob) — Entre vocês no Brahmosamaj é igual. Um indivíduo que repete sem parar “sou um pecador, um pecador” acaba mesmo tornando-se um pecador.

Tenham fé no Nome do Senhor: “Pronunciei Seu Nome, o pecado desapareceu, onde foi parar meu pecado?” Krishnokishor era cem por cento hindu, um brâmane de alta casta. Uma vez ele estava em Brindabon18, saiu a passeio e  sentiu sede. Perto de um poço estava um homem, que lhe perguntou: “Você quer tirar água para mim? Qual é sua casta?” O homem respondeu: “O senhor não pode beber pela minha mão, sou da casta dos curtidores”. Krishnokishor respondeu-lhe: “Diga Shiva. Muito bem, agora dê-me água”.

Pronunciar o nome do Senhor purifica o corpo e o espírito. Para que falar de pecado e inferno? Pense “O que fiz de mal não farei mais” e tenha fé em Seu Nome.

O Mestre foi invadido pela emoção e cantou o louvor do Nome:

 

Quero morrer pronunciando Teu Nome, Durga! Durga!...

 

Nunca pedi para a Mãe outra coisa que não fosse amor. Costumava oferecer flores a Seus pés de lótus, dizendo:

 

Mãe, para Ti a virtude, para Ti o pecado, retoma-os, dá-me o amor puro. Mãe, para Ti a pureza19, para Ti a impureza, retoma-as, dá-me o amor puro. Mãe, para Ti o bem, para Ti o mal, retoma-os, dá-me o amor puro.

 

Ouçam este canto de Ramprasad:

 

Vai para junto de Kali, ó minha alma,

A árvore que satisfaz os desejos.

Nela encontramos os quatro frutos20 .

Dos dois companheiros de tua vida,

Abandona a Ação, pega o Desprendimento.

Poderás perguntar o caminho

Ao teu filho Discernimento.

Toma contigo o Puro e o Impuro;

Quando esses rivais se harmonizarem,

A câmara divina se abrirá

Para que contemples Shyama, a Mãe.

Nascido do Egoísmo e da Ignorância,

Expulsa para longe teus dois pais

Se eles te levarem para os abismos.

Segura fortemente no pilar da Paciência.

Amarra ao poste do Sacrifício

O Justo e o Injusto, esses dois bodes,

E se se mostrarem indóceis,

Golpeia-os com a espada do Conhecimento.

Os filhos de tua ex-esposa21 ,

Grita-lhes de longe para que vão embora,

E se teimarem em te seguir,

Afoga-os no saco da Sabedoria.

Se fizeres isso, diz Prasad,

Poderás responder à morte.

Minha mente, meu filho, meu mestre,

Serás o que meu coração deseja.

 

Encontrar Deus no mundo, por que não? Vocês já ouviram falar do rei Janaka22. Quando Ramprasad chamou este mundo um “cenário de ilusão”, responderam-lhe23 que uma vez obtido o fruto do amor,

 

Esse mundo é um palácio de alegria:

Bebo, como e divirto-me.

Jonok foi homem sem igual,

Quem ousa censurá-lo?

Ele aproveitou dos dois lados24

Bebendo o leite a copos fartos.

 

Mas não podemos tornar-nos um rei Janaka de repente! Ele teve que praticar muitas austeridades em solidão. Mesmo se ficarmos no mundo, a solidão é indispensável de vez em quando — deixar o trabalho durante três dias, sair sozinho e chorar diante de Deus é uma coisa boa. Mesmo que haja a oportunidade de um único dia de solidão, aproveitem. As pessoas derramam baldes de lágrimas por seus filhos. É preciso chorar por Deus também. De vez em quando vocês devem ir sozinhos rezar para Deus. No mundo, no meio do turbilhão das preocupações, é muito difícil no início tornar a mente estável. Como uma árvore plantada à beira do caminho: quando ainda é jovem, é preciso protegê-la com uma cerca contra as cabras e as vacas. Depois que o tronco engrossa tira-se a cerca e pode-se até amarrar um elefante nele.

É como um doente que delira, com um pote d’água e saborosos picles de tamarindo em seu quarto. Se quisermos que ele sare, será preciso retirá-los, apesar de sua sede. O doente é o mundano, o pote d’água são os prazeres do mundo, e os picles, que de se pensar dão água na boca, são a companhia das mulheres. Ele precisa de um bom tratamento médico, longe de tudo isso.

É necessário atingir o discernimento e o desapego antes de entrar no mundo. No oceano do mundo vivem crocodilos — o prazer, a cólera, etc. — mas dizem que os crocodilos não atacam aquele que esfregou cúrcuma no corpo. Muito bem, cúrcuma é o discernimento e a renúncia: só Deus é real, eterno, todo o resto é irreal, passageiro. É preciso compreender isso e amar a Deus. As pastoras25 tinham imenso desejo de ver Krishna. Ouçam o que Radha canta:

 

No bosque a flauta de Krishna canta.

Ele me espera com certeza, de pé na trilha.

Como poderia eu ficar aqui?

Amigas, digam-me, vão vir também?

Para vocês Seu Nome não é mais que um nome,

Para mim é o tormento de minha alma,

O som de sua flauta entra em seus ouvidos,

Para mim ele soa até o fundo do coração.

A flauta de Krishna me chama: “Radha, vem!

Sem ti a floresta não tem encanto”.

 

Enquanto o Mestre cantava, seus olhos encheram-se de lágrimas, e ele disse a Keshob e aos brahmos: “Quer acreditem ou não em Radha e Krishna, é preciso que acreditem nessa atração! Façam um esforço para ter esse intenso desejo de Deus. Se conseguirem, verão Deus”.

 

7  A maré baixa se fazia sentir. O vapor avançava rapidamente e encontrava-se agora à altura de Calcutá. Mandaram dizer ao capitão para ultrapassar a ponte e continuar em direção ao jardim botânico. A maioria dos pressentes não seria capaz de dizer quanto tempo havia durado o passeio, nem onde estava o barco, de tal forma estavam ocupados em ouvir Sri Ramakrishna.

Keshob mandara preparar e servir pipoca de arroz e castanha de coco; cada um pegou um pouco na fralda da roupa e começou a comer. Isso divertiu a todos. Durante aquela pausa o Mestre notou que Keshob e Vijoy evitavam olhar-se. Era tão cheio de benevolência para com todos que se dirigiu a eles como a crianças que estão emburradas uma com a outra.

SR (a Keshob) — Hei! Bijoy está aqui! A briga de vocês parece a guerra entre Shiva e Rama (risos): Shiva era o guru de Rama e eles logo se reconciliaram, mas entre os espectros que seguiam Shiva e os macacos que seguiam Rama, as brigas nunca pararam (risada geral). Até em família pode haver brigas. Rama teve que entrar em guerra com seus próprios filhos, Lava e Kusha! Ou ainda, uma mãe e sua nora podem ambas observar o jejum da terça-feira, sem precisar fazer suas devoções juntas; uma irá aqui e outra ali. Você fundou uma igreja, e Bijoy acha que precisa de uma também (risos). Bom, cada uma tem sua utilidade. Lembrem-se: quando o próprio Senhor jogava seu jogo houve os desmancha-prazeres Jatila e Kutila26 . E por quê? Porque sem Jatila e Kutila o jogo fica sem graça (risos). Sem elas não haveria uma verdadeira diversão!

Ramanuja era partidário da não-dualidade moderada27, seu guru da não-dualidade absoluta, e eram discussões teológicas sem fim. Mas eles conservaram seus laços de mestre para discípulo, enquanto seus próprios alunos brigavam.

 

8  A atmosfera havia-se desanuviado. O Mestre dirigiu-se novamente a Keshob:

- As coisas andam mal porque você aceita qualquer um como discípulo, sem examinar sua natureza. As pessoas são parecidas por fora, mas por dentro são diferentes: nestas domina a paz (sattva), naquelas a força (rajas), e noutras a obscuridade (tamas). É como os bolos recheados: todos parecidos por fora, mas ao comê-los pode-se encontrar creme, coco, ou só patê de lentilhas (risada geral)!

Você sabe como eu vivo? Eu me divirto e deixo minha Mãe fazer tudo. Há três palavras que me espetam como espinhos: guru, pai e chefe28. O verdadeiro guru é Deus29, é Ele que dá a instrução. Minha atitude é a de uma criança. Existem milhares de gurus, todos querem ser guru — mas quem quer ser discípulo?

Ensinar religião é muito difícil. Não se deveria fazê-lo sem ter recebido ordem de Deus em pessoa. Narada, Shukadeva, Shankara30 receberam tal ordem. Mas sem mandato de Deus, fala-se e não sobra nada. Você conhece as tagarelices de Calcutá. Enquanto há fogo debaixo da chaleira ela chia, mas pára assim que a lenha acaba. As pessoas de Calcutá são como um camponês que cava um poço. Ele diz que está procurando água, mas quando encontra pedras grandes vai cavar mais longe; ali ele encontra areia, pára e recomeça novamente do zero. É assim que eles são.

Mas não deve ser uma ordem imaginária: estou lhe dizendo que podemos realmente vê-Lo e falar com Ele, e receber a ordem de ensinar — e então que poder terão nossas palavras! Elas removerão as montanhas. Mas conferências, para quê? As pessoas ouvem, saem e esquecem tudo; o resultado é nulo.

Existe em algum lugar31 uma lagoa chamada Haldarpukur. Alguém se acostumara a fazer suas necessidades à noite na ribanceira, e os que vinham banhar-se pela manhã ficavam enojados. Gritavam como podiam, mas no dia seguinte era a mesma coisa (risos). Então eles se dirigiram à administração e veio um guarda de uniforme que colocou uma placa “Proibido depositar lixo”, e os aborrecimentos cessaram.

Para ensinar é preciso usar o uniforme de Deus. Senão as pessoas zombam. A autoridade não vem de nós mesmos, mas de outrem. Um cego conduzindo um cego o faz tropeçar (risos). Faz-se mais mal do que bem. Só aquele que alcançou Deus recebe o olhar interior que distingue o bem do mal, adivinha do que os seres humanos padecem. Então pode curá-los.

Sem uma ordem de Deus, é orgulho dizer “vou ensinar”. O orgulho vem da ignorância. O ignorante diz: “Sou eu que estou agindo”. É Deus que age, Deus que faz tudo, eu não faço nada. Se compreendermos isso alcançaremos a libertação. Ao pensar “eu trabalho, eu ajo”, perde-se a paz e encontra-se o sofrimento.

 

9  Todos vocês falam em ajudar o mundo. O mundo é algo enorme! Quem são vocês para ajudá-lo? Pratiquem sua religião, vejam Deus, assim terão Sua força para ajudar o mundo, assim poderão fazer o bem. Senão, não terão êxito.

UM BRAHMO — Então, enquanto não se viu Deus deve-se ficar inativo?

SR — Por que inativo? Pensar em Deus, cantar Sua glória, trabalhar com desapego, há muito que fazer!

O BRAHMO — Mas e a família, o dinheiro?

SR — Claro, isso também, mas só o necessário para sustentar a família. E orar a Deus em solidão: “Por favor, permite que eu faça tudo isso de maneira desinteressada! Por favor, diminui minhas obrigações, pois quanto mais fico ocupado, menos penso em Ti. Fico imaginando que trabalho sem apego, mas na verdade sinto prazer e trabalho para mim. Faço muitos donativos para organizações de caridade, mas é para que falem bem de mim”.

Shombhu Mollik32 falava sem parar em fundar hospitais, dispensários, escolas, abrir estradas, cavar reservatórios de água. Eu lhe disse: “Não saia à procura dessas coisas, faça o bem que encontrar para fazer no seu caminho, e isso sem buscar satisfação pessoal. Não é bom ficar aumentando suas responsabilidades, você vai acabar esquecendo Deus. Um dia um homem foi ao Kalighat33, e passou todo o tempo à porta distribuindo esmolas sem sequer entrar para ver a Mãe (risos)! Faça o contrário: primeiro abra caminho com os cotovelos até a imagem de Kali, e ao sair distribua tudo o que você quiser, muito, se tiver vontade. É para encontrar Deus que você age”.

Eu disse a Shombu: “Imagine que você esteja diante de Deus. Será que você vai lhe dizer Senhor, dá-me tanto e tantos hospitais e tantos dispensários”? (risos). Um devoto nunca diz isso, ele diz: “Senhor, dá-me um lugar a Teus pés de lótus, permite-me ficar em Tua presença, dá-me um amor puro por Ti”.

O caminho da ação desapegada (karma yoga) é muito difícil. Muito difícil também, nesta Era de Ferro34, cumprir os rituais prescritos pelas Escrituras. As pessoas nessa Era passam seu tempo em busca de alimento e não podem mais cumprir todas aquelas cerimônias. É como a febre: antes que os remédios tenham tempo de agir, o doente já está morto. Não se pode mais esperar tanto, agora é dado o Antifebre do Dr Gupta. Em nossa Era de Ferro (kaliyuga), o caminho do amor é o melhor: repetir o nome de Deus e orar. É o que convém ao nosso tempo. (Dirigindo-se aos brahmos) — Vocês são bhaktas, repetem o nome de Deus, rezam para a Mãe; em verdade são abençoados, sua atitude é a melhor! Vocês não afirmam que o universo é um sonho como os vedantistas, vocês são devotos. Pensam que Deus é Pessoal. Muito bem! Se O chamarem com verdadeiro desejo, certamente O verão.

 

10  O barco voltara ao cais, e cada qual se preparou para descer. Na saída da cabine, a lua cheia de outubro brilhava pura no céu e refletia-se no Ganges, dando à cidade um resplendor mágico. Trouxeram um fiacre* para o Mestre, e M instalou-se com um ou dois discípulos. Nondolal, o sobrinho de Keshob, subiu também para acompanhar o Mestre um pouquinho. Quando todos já estavam sentados, deram pela falta de Keshob: “Onde está ele? Onde está Keshob? E puseram-se a olhar por todos os lados. Ele chegou sozinho, sorridente, perguntando: “Vocês vão todos com ele?” Depois prosternou-se diante do Mestre e tomou a poeira de seus pés35. O Mestre disse-lhe adeus com muita afeição.

O carro pôs-se a caminho por uma larga avenida do bairro inglês. A lua cheia subia no céu, iluminando casas esplêndidas que pareciam congeladas pelo frio, imaculadas ao luar. Dois bicos de gás brilhavam em cada porta, e guirlandas de lâmpadas ao longo das janelas. De vez em quando ouvia-se música, harmônio ou piano, ou uma voz de mulher cantando em inglês. O Mestre ria de prazer. Depois disse: “Estou com sede. Como vamos fazer?” Nondolal mandou parar o veículo em frente ao India Club, subiu para buscar um copo de água e voltou. O Mestre perguntou sorrindo: “O copo está limpo?” Nondolal respondeu que sim, e o Mestre bebeu36. Estava alegre como uma criança e inclinava-se o quanto podia para ver melhor as pessoas, os veículos, os cavalos, as luzes. Em Kolutola, Nondolal desceu e o carro seguiu pela Shimulya Street para chegar à casa de Shurendronath Mittro, que o Mestre chamava carinhosamente de Shuresh37. Era um discípulo fervoroso do Mestre38, mas não estava em casa; fora ver sua nova casa de campo39. As pessoas da família convidaram o Mestre a sentar-se numa sala do andar térreo. Quem ia pagar o fiacre até Dakshineswar? Se Shurendro estivesse lá cuidaria disso, mas como fazer? O Mestre disse aos discípulos: “Então vão pedir para as senhoras! Elas sabem muito bem que os maridos costumam nos visitar”, e todos riram.

Norendro morava no bairro e o Mestre mandou buscá-lo. Abriram um salão no primeiro andar e estenderam uma esteira para sentar-se. Duas ou três pessoas puseram a cabeça na porta para olhar. Na parede havia um quadro pintado a óleo segundo as instruções de Shurendro, que representava o Mestre mostrando a Keshob a unidade de todas as religiões: hindus, muçulmanos, cristãos, budistas, e as diferentes seitas da Índia: vaishnavas, shaivas, shaktas40.

O Mestre sentou-se sorrindo e já estava começando uma conversa quando chegou Norendro, o que lhe deu uma alegria sem igual. Ele disse: “Você precisava ver que passeio de barco nós fizemos com Keshob! Bijoy estava lá e todo mundo”. Depois indicou M: “Pergunte para ele41 o que eu disse a Keshob e Bijoy, e como a sogra e a nora fazem suas devoções da terça-feira, e Jatila e Kutila que são necessárias para o jogo não ficar sem graça, tudo o que foi dito”. (Virando-se para M) — “Não é?” M respondeu: “Sim, senhor”.

A noite avançava e Shurendro ainda não voltara. Era preciso retornar a Dakshineswar, pois já eram nove e meia. A rua ainda brilhava ao luar, e o Mestre subiu no fiacre, enquanto Norendro e M o saudavam. Depois cada um foi para sua casa em Calcutá.



35 Ou Bhavanath, um jovem discípulo muito fervoroso e muito amado por SR, que será envolvido pela vida em família e se afastará antes da morte do Mestre.

36 A atitude geral desses jovens entre si, e dos adultos para com eles, corresponde mais à adolescência — tendo-se em conta a Índia ou a época.

Ou porque se trata da Índia, ou por causa da época, a atitude geral desses jovens entre si, e dos adultos para com eles, corresponde mais à adolescência. (Qual frase fica melhor?)

37 De bruços no chão, atitude usual diante de uma imagem divina ou de um santo.

38 O demônio que raptou Sita, esposa de Rama; Vibhisana, mencionado acima, devoto de Rama, é seu meio-irmão.

* Local espaçoso, com o teto sustentado por colunas, o natmandir situa-se diante de um templo e é usado para música devocional, reuniões religiosas etc.

39 Um discípulo pertencente a uma rica família de proprietários rurais, mas que levava uma vida retirada graças a uma renda bem modesta oferecida por seus irmãos. Sua casa era a “base” de SR em Calcutá.

40 Literalmente, “quantos centavos”.

41 Ramachandra Datta e Manomohan Mitra, os dois primeiros verdadeiros discípulos de SR, chegados em 1879. Eram dois primos de cerca de trinta anos: Rama era médico e ateu naquela época; Manomohan, funcionário e brahmo.

42 Um discípulo extremamente importante, o futuro Swami Brahmananda, uma personalidade majestosa. Havia sido casado muito jovem com uma irmã de Manomohan.

43 Nityagopal Sen , um discípulo ainda jovem, de temperamento muito extático, que depois da morte do Mestre seguirá um caminho independente. Parece ter deixado poucas pegadas.

44 O afluxo de sangue colorindo a pele do peito é um sinal exterior do êxtase, mencionado várias vezes nos Diálogos.

45 O pandit Vidyasagar, de que se falará novamente no Diálogo 3, fundador de várias escolas em Calcutá, numa das quais M ensinava.

46 Alimento oferecido aos deuses no santuário familiar; mas aqui se trata do alimento oferecido primeiro ao Mestre.

47 Ele podia entrar em êxtase de modo imprevisível, e colocar-se em situações perigosas. Já se queimara gravemente num braseiro, e em 1883 quebraria o braço esquerdo. Um pouco mais tarde, um discípulo (Latu) ficaria permanentemente em Dakshineswar.

48 Sobrinho e companheiro de SR, com passar do tempo tornara-se cada vez mais possessivo e arrogante e fora mandado embora por uma atitude inadequada para com os donos do templo. A saída de Hriday permitiu à multidão de discípulos o acesso a SR.

49 Um professor de sua escola, que ensinava sânscrito.

50 É o início do incansável proselitismo de M, junto de seus colegas professores, de seu patrão Vidyasagar, e sobretudo de seus alunos, o que provocará conflitos e o levará a deixar essa escola por ocasião da doença de SR.

51 Ver a tradução de Michèle Lupsa, n.º 133. Os “seis pontos de vista” são as seis escolas clássicas da filosofia indiana.

52 Veremos várias vezes a descrição dos “sete planos” aos quais a mente se eleva. Na fisiologia mística dos Tantras, esses sete planos são representados por sete lótus, entre a base da coluna vertebral (muladhara) e o alto da cabeça (sahasrara). A energia que percorre esses sete centros é identificada com a Mãe.

53 O cisne macho é Shiva, o cisne fêmea é Kali. Sua união é a ascensão da energia vital até o sétimo lótus, o de mil pétalas.

54 Em sânscrito Vrindavan, o lugar da infância de Krishna e de seus amores com as gopis.

55 Literalmente, Kanai — um nome de Krishna — depois Ka.

* Original I.2, tradução inglesa 5.

1 Vijay Krishna Goswami, um dos dirigentes brahmos que não aceitara nem o culto que Keshav permitia que lhe prestassem e nem o casamento de sua filha com o filho de um maharaja antes da idade autorizada. Vijay pertencia à linha espiritual vishnuísta dos Goswamis, descendentes de Advaita Goswami, companheiro de Chaitanya.

2 Veremos que se trata de um grande iate a vapor, que talvez pertencesse ao genro de Keshav, o Maharaja.

3 Um babu é um bengali respeitável. Freqüentemente as pessoas “bem situadas” são designadas pelo seu nome seguido de babu (cf. o espanhol don).

4 Isso prova a afeição de Vijay por SR, pois ele vai enfrentar um ambiente hostil, como veremos.

5 M conhecia Keshav, do qual sua esposa era prima.

* Roupa masculina hindu que consiste numa peça de tecido enrolada na cintura, descendo até os pés.

6 Santo famoso que vivia numa caverna em Ghazipur, perto de Benares. Após a morte de SR, Vivekananda irá para junto dele, e se sentirá tentado a tornar-se seu discípulo.

* Esse parágrafo foi omitido por Swami Nikhilananda.

7 Alguns termos sânscritos foram substituídos por palavras comuns. Traduzimos por “vedantista” o termo jñani, isto é, aquele que segue o caminho do Conhecimento; “o Uno” é Brahman; “a Alma” é o Atman, ou seja, a alma individual profunda. E “devoto” traduz bhakta. Aí se encontram portanto três dos caminhos tradicionais da Índia: jñana, raja, bhakti. Falta o caminho da ação, karma yoga.

8 NP — De acordo com a filosofia  Samkhya os vinte e quatro tattvas, ou princípios cósmicos, são: os cinco grandes elementos em suas formas sutis (éter, ar, fogo, água, terra); o ego, ou “consciência do eu”; buddhi, ou inteligência; Avyakta, ou o Não-Manifestado (no qual sattva, rajas e tamas permanecem em estado indiferenciado); os cinco órgãos da ação (mãos, pés, aparelho fonador, aparelho reprodutor, aparelho excretor); os cinco órgãos do conhecimento (olhos, ouvidos, nariz, língua, pele); manas, ou mente; e os cinco objetos dos sentidos (audição, tato, visão, paladar, olfato). Todos eles pertencem à Prakriti, ou Natureza, e são distintos de Purusha, ou Consciência. (cf. Swami Nikhilananda — The Gospel of Sri Ramakrishna, Sri Ramakrishna Math, Madras, p. 1046).

9 Shakti: deve-se traduzir por uma palavra feminina, “força”, “energia” (melhor do que “poder”, por exemplo), a fim de expressar que se trata da Mãe, manifestação pessoal do Absoluto Impessoal.

10 Mais um termo técnico e uma oposição clássica: o Jogo Divino (Lila) em oposição ao Absoluto, o Eterno (Nitya).

11 Adyashakti, a Energia Primordial.

12 Keshav dirige-se a SR com a forma mais respeitosa do verbo, ao passo que SR usa a forma “média” mais familiar, ou mistura as duas.

13 Escrituras nas quais Shakti, a Mãe, desempenha um papel primordial.

14 Kala é aqui um nome para Shiva, o Absoluto.

15 “Kali” significa “a Negra”, e sua imagem é negra. SR responde a certos argumentos da prédica contra o culto das imagens.

16 Alusão a uma festa em que as crianças soltam pipas, cuja linha tem pedacinhos de vidro para cortar a linha do vizinho.

17 Trata-se da maya, um dos grandes temas da filosofia vedântica: o encantamento, o feitiço pelo qual o homem perde, ou pensa ter perdido, a consciência do Uno (Brahman). Para Ramakrishna, maya identifica-se com a Mãe.

* Traduzido conforme Swami Nikhilananda.

18 Vrindavan, o lugar da infância de Krishna, alvo de grande peregrinação.

19 A pureza ritual, alimentar; a casta.

20 Os prazeres (kama), as riquezas (artha), a justiça (dharma), a libertação (moksha). A árvore é o legendário kalpataru.

21 A alusão é obscura. A tradução de Swami Nikhilananda denomina-a “Mundanalidade”.

22 No Ramayana, o pai de Sita, a esposa de Rama. Era ao mesmo tempo um rei e um sábio.

23 Aju Gonsai ou Goswami, um poeta vishnuísta com o qual tinha uma rivalidade amistosa (nota de Michèle Lupsa).

24 O mundo e Deus.

25 As gopis, apaixonadas por Krishna adolescente, cuja história é contada no Bhagavata Purana, que é algo como o Cântico dos Cânticos indiano. Radha é a mais amada dentre elas.

26 A sogra e a cunhada de Radha, com ciúme de seu amor por Krishna.

27 Vishistadvaita, uma forma de não-dualismo que mantém a realidade do Deus Pessoal ao lado do Deus Impessoal.

28 Tradução aproximada para “ator” (agente do ato), aquele que age por si mesmo, termo ambíguo em português.

29 Sat-chit-ananda, Ser-conhecimento-beatitude, um modo clássico de designar Deus sem personalizá-Lo.

30 O maior mestre da Vedanta, partidário do monismo estrito (advaita).

31 Em Kamarpukur, a aldeia natal de SR.

32 Sambhu Mallik, um homem rico e religioso, adepto do Brahmosamaj, por intermédio do qual SR fora colocado em contato com o cristianismo, e que durante alguns anos cuidara das necessidades cotidianas de SR.

33 O templo principal de Kali  em Calcutá.

34 A Índia, como a Grécia, tem seu mito das quatro Eras (yuga) da humanidade, mas com um tempo cíclico. A Era de Ferro é denominada kaliyuga, “a era ruim” (sem relação com a deusa Kali, “a Negra”).

* Antigo carro de praça puxado a cavalo, alugado por corrida ou à hora.

35 A saudação indiana às pessoas muito respeitadas (guru, pais): tocar seus pés e depois a própria testa.

36 M procura mostrar que SR, apesar de ser brâmane, faz poucas exigências quanto à pureza ritual.

37 O texto inverte os dois nomes, por engano a nosso ver.

38 Ver Diálogo 13, nota 1.

39 Que SR visitará no Diálogo 13.

40 Seitas cujo deus principal é, respectivamente,Vishnu, Shiva e a Mãe.

41 Talvez M esteja indicando aqui o início de sua missão de cronista.

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