O
SAGRADO ENSINAMENTO DE SRI RAMAKRISHNA
A
natureza real do homem
16.
O número um pode ser elevado a qualquer valor, se lhe for agregado
zeros, mas se houver omissão do um, os zeros, em si, não têm nenhum
valor. Do mesmo modo, enquanto o jiva
(alma individual) não se adere a Deus, que é o Um, não tem nenhum
valor, pois todas as coisas adquirem seu valor pela relação que têm
com Deus. Mas se o “jiva”
se une a Deus, que está por detrás do mundo e lhe dá seu valor e faz
todo seu trabalho por Ele, acrescenta seu valor; por outro lado, tudo se
tornará vão, no final, se ao esquecer de Deus, fizer grandes obras
somente para orgulhar de si mesmo.
17.
Como uma lamparina não pode arder sem azeite, assim o homem não pode
viver sem Deus.
18.
Deus é para o homem o que o ímã é para o ferro. Por que, então,
Deus não atrai o homem? O ferro que está coberto de lodo não é
atraído pelo ímã. Do mesmo modo, o homem mergulhado na maya
(ignorância), não sente atração pelo Senhor. Mas se tirar o barro
com água, o ferro fica com liberdade de movimento. Igualmente quando,
pelas constantes lágrimas da oração e do arrependimento, a alma lava
o lodo da maya, que está
aderido ao mundo, em seguida o Senhor a atrai para Ele.
19.
A união do jivatman e do
Paramatman (ser individual e Deus) é como a união das agulhas de
um relógio, o que ocorre uma vez a cada hora. Estão relacionados entre
si e são interdependentes e embora marchem geralmente separados, podem
unir-se nas oportunidades favoráveis.
20.
A alma acorrentada é o homem, mas quando está livre das cadeias (maya)
é o Senhor.
21.
Qual é a relação entre o
jivatman e o Paramatman?
Como uma corrente de água parece dividida em dois quando cruza com uma
ilha, assim o Indivisível aparece dividido em dois – o jivatman
e o Paratman – devido a
limitação da maya.
22.
A água e a borbulha são uma só e mesma coisa. A borbulha surge da
água, flutua e se dissolve nela. Assim também o jivatman
e o Paratman são uma só e a
mesma coisa, sendo sua diferença somente de grau. Um é finito e
limitado e outro é infinito; um é dependente e outro independente.
23.
A idéia do ego individual é como se cercássemos uma porção de água
do rio Gangá (Ganges) e o chamasse que “meu Gangá”.
24.
Se atirássemos um pedaço de chumbo num recipiente contendo mercúrio,
se misturaria a ele. Do mesmo modo, a alma individual perde sua
existência limitada, quando mergulha no oceano de Brahman (o Supremo).
25.
Deus é infinito e o jiva é
finito. Como pode o finito abraçar o infinito? É como se uma boneca de
sal quisesse medir a profundidade do oceano. Ao entrar no mar, a boneca
de sal se dissolveria. De forma semelhante, o jiva,
ao tratar de medir e conhecer Deus, perde esse estado que o fazia
parecer como algo distinto e se faz um com Ele.
26.
O Senhor Mesmo é quem atua na forma humana. Ele é o grande
prestidigitador e a magia de jiva
e jagat é Sua prestidigitação. Só o prestidigitador é real, seus
truques são irreais.
27.
O corpo humano é como uma panela; e a mente, o intelecto e os sentidos,
são como água, o arroz e as batatas. Ao se colocar sobre o fogo a
panela contendo água, arroz e batatas, ela se esquentará e se alguém
a tocar, queimará os dedos, embora o calor não pertença à panela, à
água, às batatas ou ao arroz. De igual modo é o poder de Brahman no
homem, o qual impele a mente, o intelecto e os sentidos, ao cumprir suas
funções. E se aquela força cessa, estes também deixam de funcionar.
A
escravidão do homem
28.
A verdadeira natureza do jiva
é Existência-Conhecimento-Felicidade Eterna. Porém, devido a seu
egotismo, está limitado por muitos upadhis
(atributos que limitam) e esquecem sua natureza real.
29.
A natureza do jiva muda com a
união de cada upadhi. Se um
homem se vestir como um granfino e colocar um xale de musselina bordado,
seguramente aflorarão aos seus lábios canções de amor. Um par de
sapatos ingleses incharão de vaidade até o homem mais simples e, em
seguida, começará a assobiar. Se tiver que subir uma escada, saltará
de um a outro degrau como um saheb (europeu). Se um homem tiver uma lapiseira na mão, começará
a rabiscar todo o papel que tiver ao seu alcance.
30.
Como a serpente está separada de sua pele seca, assim o espírito está
separado do corpo.
31.
O Atman (Ser) não está
apegado a nenhuma coisa. O prazer, a dor, a virtude, o vício, etc.,
não podem afetar o atman de
nenhum modo, mas podem afetar aqueles que se identificam com o corpo, do
mesmo modo que acontece com a fumaça que enegrece as paredes, mas não
o espaço que há entre elas.
32.
Os vedantistas dizem que o atman
é completamente desapegado. A virtude e o vício, o prazer e a dor,
não podem afetar o atman. Mas
por outro lado, podem causar sofrimento aos que estão apegados ao
corpo. A fumaça pode manchar as paredes, mas não o espaço.
33.
A natureza dos homens varia segundo predomine neles o sattva, rajas e tamas (as
qualidades de pureza, atividade e inércia).
34.
Embora todas as almas sejam, em sua essência, uma só e a mesma coisa,
contudo podem ser divididas em quatro classes, de acordo com suas
respectivas condições. Há as almas ligadas, há as que lutam para
libertar-se, há as emancipadas e as que são sempre livres.
35.
Um pescador atirou sua rede no rio e teve uma boa pesca. Alguns dos
peixes permaneceram calmos e imóveis, sem ter intenção alguma de sair
da rede. Outros lutavam e saltavam sem poder safar-se; mas uns poucos
conseguiam, de um ou outro modo, sair da rede. Assim também, no mundo
dos homens, eles são de três classes: os que estão atados e nunca
lutam para se libertarem, os que lutam para ser livres e os que já
alcançaram a liberação.
36.
Há três bonecas – a primeira feita de sal, a segunda de pano e a
terceira de pedra. Se estas três bonecas forem mergulhadas na água, a
primeira se dissolverá e perderá sua forma. A segunda absorverá
grande quantidade de água, conservando sua forma, enquanto que a
terceira ficará completamente impermeável à água. A primeira boneca
representa o homem liberado, que mergulha no Ser Universal e
Onipresente, fazendo-se um com Ele. A segunda representa o bhakta,
ou verdadeiro amante de Deus, que está cheio de conhecimento e
felicidade Divina; e a terceira representa o homem
mundano, que não admite nem sequer uma partícula do verdadeiro
Conhecimento em seu coração.
37.
Os homens podem ser comparados às capas dos travesseiros. Há capas de
diversas cores – vermelha, negra, azul – mas todas contêm o mesmo
recheio. Assim acontece com o homem. Um é formoso, outro é negro, um
terceiro é santo e um quarto é mau. Mas no interior de todos mora o
Ser Divino.
38.
Todos os pastéis são feitos com farinha, mas são recheados com
diversos ingredientes. Os pastéis são bons ou maus, segundo a
qualidade do recheio. Do mesmo modo, embora todos os corpos humanos
sejam feitos do mesmo material, as qualidades dos homens diferem de
acordo com a pureza do coração de cada um.
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